Os olhos de Antônia lacrimejavam. Seus pais a levaram ao médico. “De onde vêm essas lágrimas?”, perguntou a mãe. “É poeira”, avaliou o oftalmo. Era uma grave alergia. Passou soro e colírio anti-alérgico. A mãe usou por quinze dias.
Continuar lendo “Os olhos de Antônia”
Clotilde foi buscar sua saia na costureira. Tinha deixado lá para fazer bainha e costurar um zíper despregado. A entrega estava marcada para aquele dia. Quando chegou, Dona Carmela foi taxativa: ficou em quarenta reais.
Continuar lendo “A diferença”
Taís Civitarese Há muito tempo esperava essa ligação. Esperava sem esperar. Esperava para, depois que passasse, não ter que esperar nunca mais. Sabia que ela viria um dia e que não tardaria muito. Preparei-me. Durante anos, meditei sobre como seria o momento. O que eu estaria fazendo. Quem estaria comigo. Pedi a Deus, sem pedir, que fosse suave. Que fosse leve. E menos traumatizante do … Continuar lendo Ainda sobre vovó – a notícia
Chegou a quarentena. E o maridão logo avisou:
– Vou me inteirar das notícias enquanto você cuida da casa.
Sentou-se com a expressão bem séria em seu canto habitual da sala, abriu um pacote de ‘chips’ e começou a remexer a internet em busca de informações que nos salvariam a vida.
Continuar lendo “Maridão”
Taís Civitarese Ontem teve a Super Lua, mas eu nada vi. O céu estava nublado, coberto por sombras acinzentadas que se moviam de forma irregular. No entanto, saber que por trás daquelas manchas brilhava a lua me trouxe alívio. Ela estava lá, com todo o seu esplendor e circunferência, ouvi dizer. Apenas não estava visível para mim… Ao procurá-la por alguns minutos, empenhei-me em vasculhar … Continuar lendo Coisas que não são vírus
Taís Civitarese E foi assim que um belo dia o empresário teve que aprender a lavar as próprias meias. Da contingência, não se escapa. Ela veio (e sempre vem) como um desvio na estrada. O mundo se internou. Nesse interim, a coisa mudou de figura. Planta, não sabia nem aguar. Como se pede uma pizza? Também não sabia. O pano que se passa no chão … Continuar lendo Acontece
Taís Civitarese Sábado passado, eu tinha um almoço marcado com minhas amigas. Festa de mães e crianças, uma farra! Na última hora, decidi não ir. Precisava ver minha avó. Ela almoçava na casa da minha mãe. Fui para lá. Sua voz alta e potente contava casos e ria. Enchia o ambiente. Ficamos juntas um pedaço da tarde, ela me deu um livro e falamos da … Continuar lendo Vovó
Taís Civitarese A gente já estava com o coronavírus. Só não sabíamos. Já portávamos a coroa imaginária que nos fazia crer sermos os donos do mundo. Que nos fazia inconsequentes. Que nos levava a subestimar a natureza e a desacreditar de seu poder e de sua soberania. Esse vírus nos contaminou faz tempo. E desde então, seguíamos a vida como reis. Reis do tempo, reis … Continuar lendo A epidemia já estava aqui
Taís Civitarese Hoje à tarde, vou encontrar minha amiga. Antes do corona chegar. Tomaremos café com bolo e jogaremos conversa fora. Conversa essa que se joga fora e cai dentro. Vamos rir juntas e planejar o futuro. Hoje à noite, verei minha avó. Semana que vem ela completa 87 anos. Preciso abraçá-la com urgência enquanto ainda está perto de mim. A sombra do adeus a … Continuar lendo Antes
Taís Civitarese Uma vez, aos 13 anos, numa festa de família, minha tia me perguntou se eu já tinha namorado. Eu, que nessa idade ainda brincava de Barbie e mal tinha coragem de conversar com um menino, fiquei desconcertada. Senti-me errada e falha diante da concepção familiar do que era ser adolescente. “Será que já deveria ter?”, pensei. Essa pergunta me assombrou pelos anos que … Continuar lendo Túnel
