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Saudade de mim mesmo

Eduardo de Ávila

O ano mal começou e já me dá sinais que será, mais uma vez, de muita provação. Aprendi com o tempo a administrar bem minhas emoções, positivas e negativas, tanto que nunca cheguei ao ápice de qualquer euforia e tampouco conheci o fundo do poço. Quando aproximo de uma dessas extremidades, já começo a me preparar para o caminho de volta. Aprendi, depois de muito sofrimento, que essa é a regra da vida.

Domingo cedo, seguindo o roteiro do início dessa nova temporada, em casa organizando para a semana – medicamentos, programar agenda, guardar bagulhada – o pensamento é sistematicamente interrompido. Conversas pelas redes sociais, notícias – nem sempre boas -, melancolia insistente, enfim me equilibrando como numa performance circense. Ah! Se pudesse viver sempre como nos tempos e sonhos da infância e adolescência. Até que tento e costumo até me enganar assim.

A dor das perdas, tanto de quem fez passagem quanto de quem se distanciou, levando pessoas que nos foram e ainda são muito caras. Fui convocado a ir numa despedida de pessoa com relativa proximidade, não consegui, seria o terceiro nestes poucos dias do novo ano. Faltou força e sobrou frustração. Totalmente desenergizado. Confiante na força divina, kardecismo foi minha escolha, constato que já tenho mais amigos do lado de lá que de cá. Só tenho feito um único pedido. Havendo, como creio, reencarnação quero voltar nos anos de 1950/1960. Não dou conta desse mundo egoísta dos últimos tempos.

Tudo isso tem uma razão e muita motivação. Éramos muito mais felizes. Semana passada, precisando comprar novo equipamento doméstico e dois outros utensílios de casa, arrisquei em quatro lojas como sempre foi a rotina daqueles tempos. Todas, todas sem exceção, o atendimento é um deboche. Atacadista na saída para o Rio – em frente aos antigos motéis –, duas no BH Shopping e uma no Ponteio. Nenhum atendente se dignou em orientar, sendo que na última, uma moça que tentei fosse meu socorro me deixou falando sozinho e foi dar atenção a uma cliente seguramente muito mais e$special.

As vezes me mergulho, silenciosamente, no meu ninho doméstico. Tenho, nisso sou feliz, um leque de amigas/os que não me permitem reclamar da solidão. Ao contrário, ainda que morando sozinho e já tem um bom tempo, essa solitude não me amedronta. Nem me considero taciturno. Creio, apenas confio, que se derem falta da minha pessoa em alguma manhã, não faltará quem confira se sigo teimando nas minhas convicções. São poucas, mas consistentes, Atleticanidade e Justiça Social.

Tenho filhas, duas, com mães distintas e que estão por perto. São presentes. Amei e fui amado (acredito), até tentei recentemente me entregar novamente a essa condição, mas o acordo prévio não foi superado. Se fui um menino “teimoso”, mamãe dizia isso sempre, cresci defendendo meu pensar e até hoje mantenho convicções. Nem por isso sou inflexível, ao contrário, vivo cedendo. Não me arriscaria em mudanças profundas, admitindo até ajuste de conduta, desde que não alterasse o meu jeito de ser que já tá perto de sete décadas. Saudade demais de mim mesmo.

*fotos: arquivo pessoal (muito antes de nascer pelos)

Blogueiro

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  • Reli seu emocionante texto, como sempre muito bem escrito. Faço parte do seu grupo, que sente muita saudade, de um tempo de laços de amores e amizades verdadeiras. Aliviou um pouco minha solidão acompanhada. Abraços.

  • Não tem como escapar dessa frase" no meu tempo era melhor", mas hoje em dia, comungo com seu sentimento de que esses anos foram de fato os melhores em vista do que hoje resulta do "desenvolvimento" do mundo. Sigamos, como vc gosta de dizer, até onde a vida nos permitir!

  • Linda e envolvente crônica . O mundo atual está deixando as pessoas cada vez mais distantes apesar de estarem quase sempre conectadas . Parece uma antítese, porém, tratativas se de nossa triste realidade . Sigamos ...

  • Que reflexão maravilhosa que traduz tão genuinamente a saudade , dores e angústias da geração anos 60. Entendo perfeitamente como se sente.

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