Tais Civitarese
Quando criança, eu tinha o costume de enganar a minha irmã. Diante de um pacote de balas dado a nós duas, o qual deveríamos dividir irmãmente, eu sempre punha mais pra mim. O argumento é de que eu era a mais velha. Supostamente, deveria ganhar mais. Irmã mente.
O curioso é que eu não era egoísta com brinquedos ou bonecas. O negócio eram as guloseimas: balas, chicletes e outras preciosidades. Talvez porque, naquela época, essas coisas eram raras. Estavam associadas a festas e a momentos especiais. A verdade é que sempre tive um apego muito grande por doces. Tanto que, aos nove anos, já sabia fazer brigadeiro de panela e balas delícia.
Tem gente que se lembra dos cheiros que sentiu, ou tem uma música para cada fase da vida. Eu lembro das coisas gostosas que comi. Lembro para todo o sempre. Da sopa de frango e verdura com que uma amiga me recebeu uma vez em sua casa. Do macarrão da minha avó, feito na máquina manual e servido com molho à parte. Da farofa da Irani que trabalhava conosco. Do biscoito frito da casa da Marina. Pão de queijo da casa da Luisa. E da geléia da mãe do Gustavo. Lembro do bolo de aniversário que o Bruno fez pra mim há quase 20 anos. Tinha profiteroles por cima e duas deliciosas camadas de recheio.
Lembro quando minha mãe foi para o sul do Brasil e me trouxe o primeiro chocolate mentolado que provei. Que estranha a sensação gelada misturada ao doce na língua. E me recordo de uma paçoca antiga, a mais gostosa de todas, chamada Amor.
Na casa da minha avó paterna, era feita uma geléia de mocotó perfumada. No pirex de vidro, ela parecia um enorme bloco de quartzo. Brilhante, translúcida, levemente marrom. Adocicada, mas nem tanto. Nunca mais vi outra assim.
Quanto perdão já ofereci na base do doce. E não posso dizer que foram escolhas ruins. Uma vez, decretei o fim de um namoro. Vesti-me para tal e marquei a reunião. Desisti. O namorado trouxe sorvete. Faz quase vinte anos que o sorvete vem rendendo. E desde então, meu estômago bandido já me pregou outras peças…
Meu marido me conquistou numa viagem de ônibus. Estávamos indo para Curitiba, num evento da faculdade. Seriam 13 carnavalescas horas de viagem. No ônibus tinha percussão, cantora, violão e até cerveja. Ele chegou com um saco plástico contendo Bis, Cebolitos, Pingo d’Ouro e biscoito de polvilho. À partir daí, nada mais importunou meu sono.
Foi nessa viagem que experimentamos a inesquecível pizza de strogonoff de um restaurante chamado Skate burguer. Nesse caso em particular, a memória afetiva não permaneceu exatamente pela boa lembrança… Porém, seja pelo lado pitoresco ou pelo prazer proporcionado, são sempre os sabores as marcas mais significativas.