Renainf e a indústria da multa

Eduardo de Ávila

Hoje, excepcionalmente, espaço cedido a um leitor e amigo, vitima da burocracia arrecadadora do estado brasileiro. Sigamos!

Luciano Malta Gontijo de Amorim – advogado com especialização em direito público

Ledo engano do cidadão que pagou sua multa de trânsito e achou que estava com a vida livre da burocracia.

O Sistema Registro Nacional de Infrações de Trânsito – RENAINF foi  criado, em tese, para concentrar em uma base nacional as infrações de trânsito cometidas em qualquer um dos 5.568 municípios brasileiros, no Distrito Federal e Fernando de Noronha, ou mesmo gerada pela Polícia Rodoviária Federal e pelos órgãos estaduais de trânsito (Detran’s) e assim “forçar” o cidadão a quitar suas obrigações sob pena de ficar totalmente “travado” para licenciar seu veículo ou regularizar qualquer situação de inadimplemento tanto onde sua multa foi gerada, quanto em todo território nacional. Seu veículo será impedido de rodar mesmo após o pagamento do débito até que este seja baixado em todos os órgãos, inclusive no RENAINF.

Contudo, entretando, todavia, este novo sistema de nome esquisito – RENAINF – tem sua gestão coordenada pela Secretaria Nacional de Trânsito-Senatran (antigo Denatran) e está na estrutura do Ministério da Integração e do Desenvolvimento Regional (MIDR), sendo tal secretaria o órgão máximo executivo e responsável pelo Sistema Nacional de Trânsito, com autonomia administrativa e técnica.

Até aí, tudo bem, o que está oculto nisso tudo é que o cidadão não tem acesso a uma unidade regional deste órgão, ou a uma superintendência estadual, simplesmente porque elas não existem. O RENAINF está concentrado 100% em Brasília, onde por regra, já não se conversa com ninguém. Com isso, o cidadão que teve seu veículo apreendido por ter uma multa que se encontra no RENAINF, após quitar a infração e ter a multa “baixada” no Detran; DER ou Município, poderá aguardar dias e até meses para as restrições “caírem” do sistema RENAINF e, somente depois disso, ter seu veículo liberado, ficando o contribuinte a mercê deste acinte.

Se o seu veículo estiver sido recolhido em um pátio até sua regularização, ainda que você pague de imediato a multa motivo da apreensão do carro, aí já é motivo para você colocar o RENAINF em suas orações diárias, com muita fé, torcendo mais que em uma final de campeonato, para que um iluminado servidor na Senatran aperte um botão para liberar o seu veículo. Enquanto isso, seu veículo que foi apreendido sofre pela exposição ao sol, chuva, sereno, granizo, poeira, a mercê de todas as intempéries que a natureza disponibilize para aqueles dias em que você teve seu patrimônio confiscado.

Alguém feliz com esta história ? Sim !!!!!! As empresas que são proprietárias de pátios e de guinchos que engordam sua receita as despesas com remoção e com as diárias dos veículos recolhidos pelo Estado, visando o pagamento da multa ou o recolhimento do tributo “a qualquer preço”, mesmo isso “esfole” o contribuinte que não deu causa a demora. Ao que parece, tal emaranhado burocrático foi criado e gerado para uma engrenagem ardilosa, sufocante e que acaba por humilhar o cidadão-contribuinte, que após estar “quites” com o sistema não consegue obter de volta seu bem.

Ah! Não se pode deixar de comentar que, muitas vezes, após ter quitado o débito e não vendo ocorrer a “baixa “ no RENAINF o cidadão tem que pagar um advogado para impetrar um Mandado de Segurança para conseguir liberar o seu veículo. Lá se vão mais despesas com os honorários advocatícios e custas processuais!

Revoltado com essa vergonha, o cidadão que sendo assaltado pelo sistema não tem a quem recorrer se vê tendo que arcar com as despesas do débito da multa ou do imposto, do reboque, das taxas, das diárias que se avolumam a cada dia, e quiçá de honorários e custas processuais! Muitas vezes as despesas para retirar o veículo ficam tão exorbitantes que ultrapassam o valor bem, sendo necessário que o proprietário sem posses, que muitas vezes usa o bem como “ferramenta” de trabalho, o abandone ali para virar sucata por total impossibilidade de pagamento de tais valores.

Mas há remédio para tal enfermidade ? Sim, em  tramitação na Câmara dos Deputados o Projeto de Lei nº 5206/20 que limita a cobrança de diárias e despesas dos veículos recolhidos nos pátios dos Departamentos de Trânsitos (Detran) dos estados e do Distrito Federal e conveniados com a Polícia Rodoviária Federal – PRF. Pela proposta, a restituição do veículo removido só ocorrerá mediante prévio pagamento de multas, taxas e despesas com remoção e estadia, que somados, não poderão ultrapassar 20% do valor do veículo verificado em consulta à Tabela Fipe.

Outra boa medida seria que se mudasse a logística do sistema RENAINF de forma que os próprios órgãos autuadores que geraram a infração possam baixar a multa em seu sistema após o pagamento, sendo a  restrição imediatamente liberada, não deixando tal questão a cargo do Senatran para fazê-lo a seu tempo e bel-prazer.

Assim, a nossa pedra e funda, de um DAVI contribuinte contra o Estado GOLIAS, poderia reverberar êxito!

*foto: Leandro Couri UAI/EM

6 comentários sobre “Renainf e a indústria da multa

  1. Bom dia…
    Concordo e assino embaixo sobre todo conteúdo e indignação citada. É um absurdo o que está acontecendo no Brasil, realmente uma indústria da multa, sem piedade e sem termos onde recorrer ou questionar tal penalidade. Fomos omissos durante anos, mas não dá mais pra aguentar tal massacre que sofremos a cada fato, cada multa…
    Não posso deixar de citar também a falta de respeito com o cidadão, com a família e com quem paga os impostos, recebendo um tratamento totalmente sem educação ou princípios, vindo de servidores públicos, onde o próprio nome diz (servir o povo), nos deixando muita das vezes em situações vergonhosas e absurdas, onde não podemos sequer questionar ou recorrer a ninguém.
    Parabéns pela iniciativa meu amigo, mais uma vez tem meu apoio e minha admiração por mais uma ação que pensa no coletivo e nos direitos segregados cada vez mais à nós.
    Grande abraço.

  2. Parabéns pelo serviço prestado à todos nós, cidadãos reféns da falta de compromisso de autoridades que nos humilham e muito.

  3. A indústria da multa existe por uma lacuna que é amparada num sistema que foi feito para não funcionar, por ser lucrativa e viciada está fadada a piorar na medida que a arrecadação dessa indústria for vista como uma fonte de renda “legitimada” pela sua prática.

  4. Boa tarde!
    Dai os veículos vão para leilão. Seria este mais uma situação para que a engrenagem permaneça assim?

  5. Enquanto não tivermos transporte público digno, tudo que vier será apenas paleativo.
    Me impressiona o aumento de automóveis nas cidades e estradas, tornando a mobilidade uma aventura.

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