Ainda que aguardando a segunda dose da AstraZeneca, sabe-se lá quando isso vai acontecer, sigo vivendo a liberdade condicional que – em voto monocrático – acatei, nessa decisão pessoal e unilateral. Durante esse período de reclusão, entre a prisão domiciliar e eventual independência para circular – sem pagamento de fiança – experimentei os tempos mais espetaculares de bipolaridade da minha existência.
Já contei que em março do ano passado, assumi o isolamento imaginando que fosse por duas a três semanas e quando percebi já tinha colecionado cinco meses sem ver a rua. Moro num apartamento de fundos. Depois sim, pude vivenciar alterações de acordo e conciliando minhas paranoias e desejos. Ultimamente, como registrei acima, estou quase normal. Sim, eu, pois a vida que está lá fora me assusta.
Durante esses 14 meses, se tem algo que eliminei foi recorrer ao Pronto Socorro quando alguma ocorrência me sugeria. A culpa foi do medo que tomei desse lugar, o maior foco de transmissão do vírus que apavora o mundo. Comprei termômetro, oxímetro, aparelho de pressão e duas vezes ao dia faço a medição. Alterando algo, basta ligar para a cardiologista, que sempre acalma minha hipocondria.
Tenho ido trabalhar e, mesmo antes da pandemia, já havia abolido ao veículo próprio, me utilizando de aplicativos para os deslocamentos. Além do conforto em não ter de me preocupar com o trânsito – que voltou à trágica normalidade – em contas que faço, é muito menos oneroso que a manutenção de um carro particular.
Se achar que não vale à pena, basta entrar numa concessionária e negociar que em uma semana – como em outras ocasiões – saio motorizado ao meu gosto. Guardei o larjan bem escondidinho para essa eventualidade de arrependimento. Como digo à minha gerente de atendimento bancário, não me conta que esse dinheiro tá aí numa aplicação, senão evapora sem perceber.
Também retomei a academia, que bem isso faz, além de ao final da tarde passar numa cafeteria para uma boa prosa sobre temas que me agradam. As pessoas marrentas não mudaram nada. Sempre aparece algum para provocar sobre minhas opções futebolísticas e políticas, mas – diferente de tempos passados – felizmente perdi a polidez. Com isso, minhas reações tem espantado e assustado aos malas, que estão se afastando. Assombração sabe pra quem aparece!
Tenho uma arma poderosa quando alguém tenta insistir em um incomodo e desconfortável assunto que não me interessa. Duas tossidas seguidas ou um espirro. Basta! Até quando não é forçado, a reação vem. Outro dia, um motorista de Uber, num espirro espontâneo, me chamou a atenção que “não pode espirrar dentro do carro”. Daí disse a ele que não poderia era sair de casa e usar transporte público se estivesse contaminado. Seguimos ambos, ele e eu, emburrados e sem falar nada até o destino final. Ao descer dei outro, desta vez forçado. A cara dele foi melhor que imaginei. Bem feito!
Depois desse período de isolamento, percebendo o quanto o tempo tem sido cruel, passei a observar e ouvir pessoas com necessidades de desabafar. Uma colega de profissão P da vida, reclamou – com razão – que no seu trabalho decidiram que ela agora fará atas, matéria que nunca foi do currículo escolar de jornalismo. O argumento: “você escreve bem”. Ora, fosse comigo, seriam as atas mais confusas possíveis. Pirraça mesmo!
Indo ao banco, o leitor de digital não aceita mais meu envelhecido dedo, assim como também na academia e no ponto do trabalho. Com isso, estou sendo obrigado a carregar na envelhecida memória senhas que até então não faziam parte dessa parafernália do mundo moderno. Comprar ofertas em vitrines virtuais virou outro problema, pois duas delas não chegaram ao meu endereço com o produto já pago e a dificuldade em reclamar sugere esquecer o calote eletrônico.
Que saudade dos tempos que numa madrugada fria e com chuva forte, debaixo de uma marquise com a namorada, alguém parava o carro e te oferecia carona. Deixava-a em casa e depois ainda me conduzia até a república, sem maldade ou má intenção. Gente que nunca mais cruzei pela vida. Hoje isso não seria mais possível. Tempos medonhamente modernos.
Porém, as descargas de caminhões atiradas sobre pedestres seguem incomodando, como naqueles velhos tempos. Assim como minha unha encravada, depois de importunar por dois meses, encontrou as mãos bentas e santas de uma podóloga que numa sessão de 40 minutos me tirou desse desconfortável inferno e me levou ao céu. Como dizia lá na minha Araxá: “tirou a dor com a mão”. Literalmente!
Vamos seguindo e vivendo nossos tempos aqui nessa passagem terrena para nos aperfeiçoar e melhorar. Com isso, buscamos atingir a renovação moral. Sigamos vivendo, aprendendo e extraindo o lado bom das coisas. Ainda que seja para nosso divertimento espiritual e sem prejuízo ao sonhos dos outros. A vida é bela e merece ser contemplada. Assim seja!
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Maravilha... como sempre. A vida é bela!
Abraço.