Sandra Belchiolina
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Há sete meses, lidamos com o inesperado – a pandemia. Observam-se várias fases e maneiras de compreensão e absorção desse momento, incluindo a negação – um mecanismo de defesa já estudado por Freud há dois séculos.
Relato algumas reflexões e pesquisas sobre o nosso momento – quase primavera no hemisfério sul. Tempo de olhar o que vem nos acontecendo desde março de 2020.
Caetano Veloso, em entrevista recente, fala sobre sua expectativa para o Brasil: “não tanto esperança. Mais a responsabilidade”. Responsabilidade talvez seja a palavra-chave que essa pandemia levantou.
A princípio, podemos pensar na responsabilidade com a própria saúde, com a saúde do outro e a saúde socioambiental. Nessa lógica, o desdobramento acontece e chega na compreensão de nossos elos com vida na Terra. Assim a esperança age como uma ação, um posicionamento do sujeito diante do mundo. A esperança como um afeto positivo e que coloca a pessoa em movimento.
Fazendo uma busca sobre a movimentação humana nessa quarentena e seus efeitos, alguns aspectos chamam atenção. Na pesquisa do IBGE apresentada pela Folha de São Paulo os indicadores são: a população ocupada do Brasil que é de 81%, 40 milhões de pessoas, e somente 10% foi para trabalho remoto. Sendo mais da metade no sudeste (4,9 milhões). Entre esses trabalhadores, os brasileiros remotos são: 73% por curso superior completo e acima.
As categorias que mais utilizaram do recurso: 16,6% comércio e vendas, 14% ocupações elementares, 13,10% profissionais das ciências e intelectuais ¹. A pesquisa aponta que a pandemia veio para reafirmar a desigualdade que existe no pais. A pergunta que não quer calar: e o que ocorreu com o restante da população ocupada – os 90%?
Outros números que não podem deixar de serem analisados são é o aumento de 54% de procura no atendimentos do SUS por uso de alucinógenos, que ocorreu entre março e junho, comparados ao mesmo período de 2019². Dado que vem acrescido com o aumento do consumo de álcool e da violência familiar. A Universidade do Estado do Rio de Janeiro realizou um estudo com 1.460 pessoas em 23 estados do Brasil. Os apontamentos coletados mostram o crescimento de 90,5% de depressão e 14,9% de aumento do estresse³.
No meio da pandemia (não temos a data para seu fim, ainda), acordei hoje (ontem para você que me lê) e, ao ligar o celular, surgiu o seguinte título de artigo da Folha de São Paulo: “Controle de mortes é determinante para retomada do consumo”.
Trago para reflexão: não é hora de se romper com o paradigma do consumo? Consumo, consumo… está consumindo o ser humano e seu planeta. Esse agradeceu a pandemia; o ar e as águas ficaram mais puras com a paralisação forçada. É hora das ações e pensamentos na mudança; voltarmos nosso desejo para além do consumo.
Os dados que apontei mostram desigualdade e desequilíbrio tanto da economia quanto da população. Volto na esperança como ação positiva e responsabilidades para reconstrução de um novo saber fazer fora do paradigma do consumo.
Referência:
² Revista Veja, 19 de agosto 2020
Eu entendo esta preocupação de se ir além do consumo porém vários têm medo do novo. A lógica atual é maior consumo implica em produções que implicarão em empregos que levarão salários para a população que ampliará consumo e assim vai… Esta lógica mecânica não leva em conta nada além do que está aí porém há muito além a se considerar e exige coragem e ousadia.
Abraços brasilienses (ainda à distância)