Caro leitor, hoje deixarei meus personagens (que sempre morrem no final, mesmo você não sabendo disso) de lado, e falarei sobre o real, nas minhas próprias palavras.
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Já falei com você sobre aqueles que não aceitam o momento dado, e tentam fugir para outras realidades, como é o caso de Roland, ou até mesmo aqueles que passam por ele como se nada de diferente estivesse acontecendo, como vive Sérgio. Ou, acreditem ou não, aqueles que estão sendo engolidos por aquilo que tinham fé, e até amavam – a vida em si – e não conseguem controlar muito mais do que suas próprias emoções, como ocorreu à pobre Carla.
Com isso, chego a seguinte conclusão: estamos vivendo em um momento absurdo. Explico. Os existencialistas (que acreditavam no sujeito como um ser pensante individual) cunharam, para certos efeitos, o termo Absurdo. Vindo daquela palavra que a gente usa no dia a dia (“o presidente disse isso? Que absurdo!”) para eles, esse termo não significa apenas “logicamente impossível”, mas também “humanamente impossível”. Traduzindo a frase: “é humanamente impossível que o presidente tenha dito isso.”
Por isso essa realidade, imposta à nossa volta (dada por aquilo que não controlamos e posta por aqueles que pensam controlar) é absurda. É humanamente impossível passar por isso tudo e continuar são ou inteiro. Os dois não se conciliam.
Não tenho conhecimento nenhum sobre a área da psicologia, (diferente de duas queridas, com quem também divido esse espaço) por isso não me arrisco nesse campo minado em que não sei onde as armadilhas se encontram, mas tenho conhecimento sobre observação, e consigo observar que há muito tempo nada está bem.
Antes, o sentimento de bem individual podia contagiar as pessoas. O tal “riso que contagia”. Hoje, esse novo normal (ainda não me acostumei com esse termo, e, de verdade, nem quero) não permite que eu veja além de dois olhos que olham para o chão enquanto passam por mim, com medo que eu infecte sua alma com o olhar (nesse caso, qual vírus eu passaria?). Não sei o que os lábios fazem por baixo de uma camada de pano e outra de TNT, mas, com certeza, não sorriem.
Entretanto, esses são apenas alguns dos absurdos que venho anotando mentalmente há quase três meses. Temos também: é um absurdo que os preços nos supermercados aumentem assim. É um absurdo que os programas de seguridade social, tão necessários para um país em desenvolvimento, não tenham noção de quantas pessoas precisam ajudar.
É um absurdo que um país que depende tanto do pequeno e médio empreendedor diga que pequenas empresas dão prejuízo ao governo. É um absurdo que não tenhamos uma liderança forte, que não fique ceando outros absurdos, mas sim consiga pensar em um plano que possa ser colocado em prática.
É um absurdo que, depois de seis meses, ainda usemos o argumento da surpresa. Fomos pegos de surpresa em janeiro. Estamos em junho, Gêmeos já cruza o céu. Não temos mais direito ao despreparo.
Albert Camus, escritor que ama e abusa das colocações do absurdo, um dia, escreveu: “fui posto a meio caminho entre a miséria e o sol”. Esse meio caminho, a mim, se mostra como a vida em si. Fui posto a meio caminho da miséria da terra e da queimação do sol. É uma armadilha. Não estamos apenas postos no meio desse caminho, estamos vivendo nele. E esse é mais um absurdo para a conta.
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“Amar o outro sem nome, sem ressurgência de distúrbios, sobreviver na atonia do deserto sobre o túmulo do nômade? Aqui, ninguém viveu, pobre passado, como o azul desbotado da sua sepulta; as rugas no abrigo da máscara até a queda instantânea do último grão de areia. Eu me arrepio com a queimação do sol; cegonhas isoladas se demoram; não é tarde demais.” O Segundo Suspiro.
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