Crastinum

Victória Farias Não existe razão para pânico. Nenhum motivo para a incorrência ao desespero. Não há gente gritando nas janelas, nenhum sinal de fumaça no horizonte. Nenhuma paixão queima mais em lugar nenhum. A calmaria é a única saída possível. A apreciação do café preto durante a manhã é uma monotonia aguardada. Pede-se pela calma. O desânimo é mais um efeito colateral da consciência dos … Continuar lendo Crastinum

Habémus

Victória Farias Temos. Nós temos. Nós temos tanta coisa que nem conseguimos contar. Mas não temos nada quando realmente precisamos contar. Numeramos nos dedos tudo que queremos e o resto deixamos como resto, uma obrigação da vida, um acontecimento que se foi e logo depois de ir se tornou rotina. Mas no final das contas, não temos realmente nada. Já cansei de ouvir que “dessa … Continuar lendo Habémus

Flores ainda vivas (1614) Pintor: Ambrosius Bosschaert

Verde Neon

Victória Farias As árvores remanescentes de Belo Horizonte, neste girar anual do sol, se produziram a altura de queens, e, como tal, acabaram por performar como quem performa para uma plateia embriagada, ensaiando monólogos sobre a vida para aqueles que procuram gotas perdidas nas bordas em ondas dos copos lagoinha. As flores, proclamando suas frases decoradas em azul, violeta e amarelo, não receberam aplausos, muito … Continuar lendo Verde Neon

A Criação de Adão Fresco de Michelangelo

Outono no Havaí

Victória Farias A sensação de enfiar os pés na areia nunca havia sido a sua favorita. Ele não gostava muito de areia. Incomodava e entrava em lugares impossíveis de se tirar. À quilômetros de distância do mar, podia sentir os pequenos grãos tentando acessar todos os seus poros e cantos. Mesmo com isso, amava as águas. Mas só de dia. A noite, tinha medo que … Continuar lendo Outono no Havaí

O peregrino sobre o mar de névoa, de Caspar David Friedrich, (1817-1818).

Todo olho azul

Victória Farias No meio da Terra, onde um continente um dia se despediu do outro, reina um olho azul. Gigante, como eles sempre são, seduzem qualquer um que queira se afogar a título de beleza. Todo mundo sabe que todo olho azul é assim. Infindável, sem limites, sem ter onde se segurar nem a outras cores para recorrer. Se debate violentamente na areia ou nas … Continuar lendo Todo olho azul

O gafanhoto torna-se pesado

“Não se é de parte nenhuma enquanto não se tem um morto debaixo da terra.” – Gabriel García Márquez – Victória Farias Ana acordou duvidando da realidade. Não que não acreditasse de que aquilo que corria em suas veias não fosse vida, mas carregando uma leve – e insistente – impressão de que tudo a sua volta não sentisse a mesma pulsão. Não podia dizer … Continuar lendo O gafanhoto torna-se pesado

Por essa nem eu esperava

Victória Farias É de conhecimento geral, de toda a República, que alguma coisa tem de ser feita por alguém. Não digo nomes, nem mesmo cargos. Deixo a consciência coletiva – e seletiva – crucificar quem quiser. Mas crucificar educadamente. Sem colocar culpa nem mesmo subir os números das estatísticas. Várias coisas têm sido fatídicas nos últimos tempos e é difícil colocar na balança. Até porque … Continuar lendo Por essa nem eu esperava

Ode à Tros

“Se só me faltassem os outros, vá; um homem consola-se mais ou menos das pessoas que perde; mais falto eu mesmo, e esta lacuna é tudo.” Machado de Assis –Victória Farias O que pode compensar o que perdemos? Quem pode? Sob a ordem de quem? Na Mitologia Grega, Tros teve um filho sequestrado, com a intenção de ser usado como serviçal dos deuses. O que … Continuar lendo Ode à Tros

Uma volta e meia

Victória Farias Desde o início disso tudo, já demos uma volta e meia em torno do sol. Mais uma vez, já é meu aniversário e mesmo estando a 1.674 quilomêtros por hora, sinto que não saímos do lugar. Como no dia 02 de agosto de 2020, continuamos usando máscara e como uma das últimas na fila de vacinação, ainda não ganhei uma marquinha no braço … Continuar lendo Uma volta e meia

É do Brasil, sil, sil!

Victória Farias Eu nunca me considerei uma pessoa emotiva, especialmente no quesito derramar lágrimas. Por muitos motivos, chorar para mim é uma coisa extraordinária que acontece apenas em momentos, bom, extraordinários. Meus amigos podem até mesmo pensar que sou um pouco insensível, mas acredito que eu tenha a sensibilidade adequada para os momentos adequados.  Nos meus filmes conforto choro exatamente na mesma parte, todas as … Continuar lendo É do Brasil, sil, sil!