Brisa de Inverno - "Paisagem de Inverno" - John Everett - 1829-1926

Brisa de inverno

Victória Farias Assim como tudo o que é frio, a brisa de inverno não pretendia ser, e nem sabia que era. Obstinada, aparecia nas manhãs, e, junto ao sol de aspecto gélido, ocupava as preocupações dos trabalhadores matutinos. Como tudo que não tem peso, era vazia. Às vezes se dispersava, às vezes andava em conjunto consigo mesma. Constantemente inconsciente da sua própria existência, não sabia … Continuar lendo Brisa de inverno

René Magritte - Trago seu amor em 3 dias

Trago seu amor em 3 dias

Victória Farias “Não permita que a gravidade te deixe para baixo. Você é uma estrela em ascensão. Bata nos meteoros. Descubra novos planetas. Saia daqui agora.” Autor Desconhecido – O ar abafado da loja de esquina não me deixava respirar direito. Com uma péssima percepção dos acontecimentos à minha volta, nunca havia reparado naquele estabelecimento na Rua Pernambuco, esquina com Inconfidentes. Era um lugar acanhado, colorizado em tons … Continuar lendo Trago seu amor em 3 dias

Imagem: Reprodução

Entretenimento barato

Victória Farias Porque Amazon e Netflix custam menos do que um ingresso de cinema. A sétima arte é uma coisa que me pega pelo pescoço. No meu tempo livre, aos finais de semana, gasto os minutos cronometrados em longas – e raramente em séries – que podem trocar minha preocupação pela politica brasileira por uma menos dolorida. Me concentro na fotografia – por pior que … Continuar lendo Entretenimento barato

Foto: https://www.gettyimages.com.br/detail/ilustra%C3%A7%C3%A3o/flame-ilustra%C3%A7%C3%A3o-royalty-free/173898685?adppopup=true - Jonathan, você já morreu

Jonathan, você já morreu

Victória Farias Um fogo devora um outro fogo. Uma dor de angústia cura-se com outra.William Shakespeare – Jonathan tropeçara em uma pedra enquanto andava apressado. Estava, involuntariamente, atrasado para um encontro com amigos. O alerta, que tinha programado para avisar em qual ponto de ônibus descer, travou e o avisou sobre sua parada muito depois.  Debaixo de uma chuva fina, muito diferente da tempestade da … Continuar lendo Jonathan, você já morreu

Amor em tempos de Cloroquina

– “Cara amiga, como vão as coisas? Escrevo esta carta porque meu celular pifou. Acho que o tratei muito mal nos últimos meses, então ele decidiu se rebelar. Por aqui, tudo vai meio… estranho.  Minha amiga me chamou para tomar um café por videoconferência. Eu na minha casa, e ela na dela, às 16h.  Provavelmente escolheremos um lugar que bata pouco sol, para não atrapalhar … Continuar lendo Amor em tempos de Cloroquina

Ninguém aguenta mais não aguentar mais

Victória Farias Havia uma estranheza no ar. Um descontentamento coletivo. Uma falha sistêmica quase invisível, mas que trazia incômodo a qualquer um que se interessasse em olhar de perto, ou que ligasse a televisão em horário nobre. As palavras que vinham das ondas de rádio – ouvidas durante longas filas de espera em postos de gasolina – não pareciam fazer sentido. Os gritos indignados de … Continuar lendo Ninguém aguenta mais não aguentar mais

Obra: Dmitrievskiĭ, V. K. - 1958

Eu não estou bem com isso

Victória Farias Um dia, entre uma guerra e outra, meu bisavô escreveu para a minha bisavó: “Até esta data, nada recebi de você, ainda continuo a dizer-te que a última carta que tenho sua é de 30 de Dezembro, se o carimbo não me engana. Por isso e por tudo isso, eu estou muito aborrecido com você.” Minha bisavó, com oito filhos em cada braço, … Continuar lendo Eu não estou bem com isso

Pro bem ou pro mal, é carnaval

Victória Farias É fevereiro e nada está brilhando em Belo Horizonte. Ninguém está se dizendo aquilo que não é, e o cheiro da cidade, que não é lá essas coisas em dias normais, permanece o mesmo. O único jeito de participar de alguma folia é, infelizmente – e ignorando a todos os apelos dos nossos queridos escritores Eduardo e Guilherme – assistindo a pífia participação … Continuar lendo Pro bem ou pro mal, é carnaval

Nunca mais

Victória Farias Eu me lembro de 2018. Me lembro de ficar em casa por medo de não ter como voltar. Me lembro de ligar no trabalho e explicar meus motivos, e me lembro de ter racionamento de comida no supermercado. Me lembro do trânsito causado pelas longas filas nos postos de gasolina, me lembro de pessoas perguntando em grupos de Facebook se alguém poderia lhes vender … Continuar lendo Nunca mais

"Pandora" by Charles Edward Perugini (1839-1918).

Per aspera ad aspera

Victória Farias Per aspera ad aspera = por (caminhos) tortuosos à (caminhos) tortuosos. – Os primeiros dias de 2021 parecem ter sido escritos pela perfeita caligrafia de Deus. Traduzindo: não fazem o menor sentido. A segunda-feira eterna, que insistia em ser sombra em todas as nossas ações, parece dar lugar a uma tardia terça-feira. Depois de uma virada no mínimo interessante – para usar poucas … Continuar lendo Per aspera ad aspera