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Tristeza também tem fim

Eduardo de Ávila

Sem a intenção de contrapor ou contrariar a linda composição de Jobim e Vinicius, cantada por tantas vozes da MPB – interpretada com maestria pelos saudosos Elis e Jair –, acabei concluindo que a tristeza também tem seu ponto final. Na letra de Samba de Uma Nota Só – conhecida ainda por A Felicidade –, o refrão afirma que “Tristeza não tem fim… Felicidade sim”. Tem quem, por alguma motivação inconfessável ou acomodação, dá guarida e moradia ao desânimo e sofrimento. Xispa!

Aprendi, com tantos embates e festejos durante minhas décadas de vida, já avançando com incrível velocidade bem acima do cinquentenário, que tão passageiro quanto viver são os ciclos – positivos e/ou negativos – com os quais convivemos a cada novo momento. Nenhum deles sobressai sobre o outro, mas a intensidade de um e de outro é feita e medida pela nossa reação.

Roberto Carlos, um dos pioneiros da Jovem Guarda, avisou que “Se chorei ou se sorri… O importante é que emoções eu vivi”. E foi nesta década de 60 que, além desse movimento que influenciou a juventude da época, também a Tropicália foi fundamental para a resistência democrática. E, nesse imbróglio todo, foi forjada uma geração que aprendeu a conviver com a dor e a festejar a alegria da vida. Tivemos – quem nasceu na década anterior à nossa e uma ou duas seguintes – esse privilégio de aprender a equilibrar tristeza e felicidade.

Nem só em letras musicais e roteiros de peças teatrais e do cinema brasileiro, que começavam a conquistar o mundo, nós vivíamos. Mais do que isso, a criatividade foi sendo aguçada e moldada para curtir e deixar um legado de avanços, experiências e conquistas para as gerações futuras. Com toda dificuldade, diria que, apesar do retrocesso (político, econômico e social) recente, somos vitoriosos. E é por isso que afirmo, com muita convicção, que toda tristeza tem fim.

Seja em qualquer campo do nosso íntimo, aprendi(emos) que os acontecimentos são passageiros. Nunca me entreguei a uma euforia momentânea, uma vez que sei que “nada do que foi será… de novo do jeito que já foi um dia… tudo que se vê não é… igual ao que a gente viu há um segundo”. Esse ensinamento veio anos mais tarde através de Lulu Santos. Então, assim como não me permito abusar e envaidecer na boa fase, menos ainda me rendo ao período de desânimo ou sofrimento.

E assim tenho levado meus tempos recentes. A memória, que um dia foi prodigiosa, e até a resistência física e saúde não são mais as mesmas. Cirurgia já somam nove, duas delas extraindo tumores (isso mesmo cânceres, diagnosticados precocemente, is not mole não). Meu time do coração vai seguir com altos e baixos, mas não vou deixar de te amar, ó Galo! Minha crença e confiança em atores políticos – que definem nossa economia – seguirá no campo social, ainda que eventualmente tenha de conviver com bolsolóides, leitinhos C, chupetinhas e outro que a censura parental impõe omissão. Os amores que tive e ainda possa vir a ter não irão me levar ao êxtase já experimentado, tampouco me condenarão a um luto permanente. Aquela dorzinha no meio do peito não mata ninguém e o velório é passageiro. Tenho necessidade de curtir “o que há de bom“(em mim), assim como Djavan anunciou em Sina sobre caetanear, seja nas memórias ou nas opções que a vida me permite. Sem sofrer e sem euforia.

Tristeza e felicidade são sentimentos passageiros, assim como a vida. Com a recomendável e lícita escolha pessoal. Assim seja!

Blogueiro

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  • Bom dia, Edu! Realmente "Tudo Passa", entretanto, o Tempo não passa, passamos pelo Tempo. Por aqui optando: pela paz , pela fraternidade e pela partilha com quem de fato precisa e merece. Continue escrevendo! Você é um excelente escritor. Abraços.

  • Pra mim este texto é o melhor dos últimos tempos. Tocou no que há de melhor das minhas recordações, fez acalmar a ansiedade por soluções imediatas e nos motivou a seguir “esperançando”.
    Amei!!!

  • "Bons pensamentos, boas palavras, boas ações" (Freddie Mercury, por Rami Malek, em Bohemian Rhapsody). Abraços, meu amigo! Sigamos...

  • Tudo passa, até "a saudade quando se perde um grande amor", ou até a uva, passa!
    Parabéns Dudu, bela reflexão. Enquanto não passamos, vamos curtindo, aproveitando. Valeu!

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