Meu gato branco

Peter Rossi

Hoje, acariciando seu pelo, enquanto deitado na minha cama, me dei conta de que você foi meu primeiro novo amigo, no início de uma nova etapa de vida. São vários meses juntos. Levando em conta a sua expectativa de vida, mais de dez por cento você viveu comigo. E viverá tantos outros, quantos bastem.

Me lembrei de quando nos vimos pela primeira vez. Naquele asilo simples, assim que caminhou a passos lentos, descortinou em minha retina a brancura do seu pelo. Me apaixonei. Você, meio tímido, me deixou pegar no colo, coisa que ainda insiste em resistir, até hoje.

Seus olhos não eram pedintes, eram tímidos apenas, de um verde de muito frescor. Exalava cheiro de alecrim o seu olhar.

Pronto! Tinha escolhido, seria aquele “carinha” ali, aquele todo branquinho. Escolhi um outro, mas essa é outra história. Queria dois amigos, mas, a princípio, nem tudo correu como eu esperava.

Voltei pra casa todo entusiasmado e não me dei conta que não tive a oportunidade de discutir com você se queria vir. Na verdade, eu apenas te raptei e ninguém pagaria o resgate. É estranho como essas coisas acontecem. A gente pega o amigo pelo braço, ou pelo rabo, e leva pra viver conosco, sem qualquer questionamento. O gato que se ajeite, que acostume, e se dê por satisfeito, pois agora tem um lar.

Não acho que tenha que ser exatamente assim. De fato, proporcionei pra você mais conforto. Comida à vontade, água fresca e uma caminha quentinha. Te chamei de filho e, muitas vezes, deixei fazer o que quisesse, quebrando coisas, sujando outras, enfim, você era o dono do pedaço.

Mas você correspondeu. Acabou gostando de mim e hoje sempre dorme encostado em minha barriga. Não gosta de abraços, é verdade, mas curte o calorzinho do corpo do amigo aqui. Percebo que se acostumou à rotina e acabou gostando. Ficamos amigos, mais que isso, cúmplices. Vejo no seu olhar que consegue compreender todas as minhas alegrias e momentos de angústia, só não consegue me dizer nada, mas, ainda assim, me agasalha, me acalenta. Eu e meu gato branco.

Quando mudamos de casa você veio e curtiu muito. Uma grande escada pra dependurar em cada degrau e, logo que chego, dar aquele miado típico. A gente conversa bastante. Eu te perguntando como foi o dia e você miando prá mim. Meus filhos se divertem, porque parece um diálogo mesmo: eu pergunto qualquer coisa e você mia me respondendo.

Gosto de você, meu amigo de pelo branco. Aliás, mais do que isso, acho que hoje não consigo mais viver sem você. Meu travesseiro de pernas.

Te batizei Bogart. Sim, você era o gato alfa, ou alpha, e ninguém melhor para personificar esse papel que Humphrey Bogart, na minha opinião o maior ator de cinema de todos os tempos. Tinha mesmo que ser uma homenagem, só não sei se a você ou a ele.

Fato é, meu gato branco, que ainda temos algumas coisas prá viver juntos. Você com seu focinho cheio de bigodes e eu com um nariz que não para de crescer! Sigamos nessa. E, por favor, cuide de mim, você tem sete vidas, mas eu tenho uma só!

O que basta é estarmos juntos, convivendo o silêncio dos olhares enigmáticos. Um tentando desvendar o do outro. Acho que conseguimos. Consigo perceber quando quer me pedir alguma coisa: comida, água. Você, certamente, consegue entender quando preciso da sua companhia, do seu amor. É nessas horas que você estende o corpo de pelo qual um tapete ao lado do meu coração e, ronronando, me diz: – calma, as coisas vão melhorar, elas sempre melhoram e eu estou aqui.

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