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A Moça de Oxford

Rosangela Maluf

É muito comum aceitar novos amigos virtuais, baseando-se apenas no número de conhecidos em comum. Foi o que aconteceu quando ela me solicitou amizade, pelo Facebook. Em alguns finais de semana, por culpa dos algoritmos (ou não), o número de solicitações é muito grande, dá até preguiça. E naquele domingo foram muitos os pedidos de amizade, mais de quarenta. Aceitei vários e deletei muitos. 

No dia seguinte, ao abrir a tela do face, vinte e duas notificações. Como assim? Fui olhar e, fora as  mensagens comuns do dia a dia, a grande maioria era da nova amiga. Muitas fotos curtidas ou com coraçãozinho. Beautiful woman, ela escrevia em quase todas as fotos. Fui olhar o seu perfil. Uma mulher loura, jovem. Médica obstetra em um hospital inglês, tendo vivido a maior parte da sua vida em Madri, na Espanha. Os comentários, sempre em inglês. A foto pareceu-me de revista, mas não me importei. Olhei rapidamente e só. Nenhum interesse.

Em minha página, o número de notificações continuava alto e sempre pelo mesmo motivo. A nova amiga esmiuçou a minha linha do tempo, curtindo ou amando todas as fotos, independente do local, da companhia ou de como eu estivesse. Sempre com elogios, em inglês.

Um dia, recebo mensagens no Messenger. Faz tempo que não o utilizo pra nada e geralmente não respondo. Exceções concedidas apenas a pessoas conhecidas, a quem não iria nunca ignorar.  Não respondi e publiquei um novo lembrete comunicando a todos que eu, definitivamente, não utilizava aquele aplicativo. E quem quisesse se comunicar comigo, que o fizesse ali, pela minha página no face.

Todos os dias um pequeno recado, sem nada de interessante, mas que eu deletava, sem responder, após a leitura. Começaram a surgir então algumas frases em português. Nada de agressivo que justificasse o “delete”, mas eu as ignorava.

Quero falar com você. 

Por favor, me responda. 

Tenho algo importante a te dizer.

“Marvelosa”, quero falar com você.

Por que você não me responde?

Voltei a olhar o seu perfil. A foto agora era de uma mulher madura, morena, cabelos escuros, uma roupa verde. Notei que se tratava de outra pessoa, bem diferente da loura anterior. Os recados foram, aos poucos diminuindo, e não pensei mais no assunto. Por que não a deletei? Não sei. Me era tão indiferente.

Uma tarde abro meu face e, novamente, mais de vinte notificações. Todas dela. Que chatice. Voltei ao seu perfil e vejo agora a foto de uma jovem indiana. Bem morena, sorridente, atravessando uma rua ou avenida, com uma mochila às costas. Parecia ser uma foto real e comparando com as duas anteriores, esta sim, me parecia ser ela. E novamente, a mesma chatice: a cada foto curtida por ela, um recadinho pra lá de desagradável, chato, repetitivo. Mas nada que me levasse a optar pelo bloqueio.

Refiz então, um post onde eu informava, aos novos amigos, que não respondo ao Messenger e, que utilizasse minha página para falar comigo. Postei no Face e coloquei em “comentar” apenas o nome dela. Quem sabe ela o visse, lesse e entendesse, de uma vez por todas, que eu não tinha o menor interesse em “conversar”. Poderia ter deletado e não mais me chatear? Sim, mas não havia nada de sério que justificasse um bloqueio, às vezes o que as pessoas querem apenas é um pouco de atenção.

Naquela mesma noite, entra uma mensagem daquela jovem mulher, pedindo pra falar comigo. Localizo o post que fiz, referente ao não uso do Messenger. Era segunda feira, 23 de agosto, por volta das 23h30. Eu cochilava enquanto esperava pra ver se o show do Criança Esperança valeria a pena. Leio estarrecida uma mensagem: 

– Olá, linda mulher! Sou lésbica e confesso, estou apaixonada por você. Preciso muito lhe falar. Me mande um recado. Vou esperar. 

Todo mundo sabe que existe muita paquerinha na internet, independente da idade, da localização, enfim! Mas até então, nunca me havia deparado com uma situação parecida. Sentia-me constrangida. Por que não percebi os sinais insistentes de aproximação? Mas, como poderia imaginar que aquela jovem da foto teria outras intenções? Pela foto do perfil ela teria idade para ser minha filha. 

Jamais tive preconceito com o que quer que seja. Numa época em que pouco se falava sobre o assunto, minha mãe ressaltava os casos escondidos sobre homossexuais e nos recomendava respeito e compreensão. Meus irmãos e eu crescemos assim, neste ambiente de tolerância, respeito e educação. Anos depois, muito próximo a nós, inclusive na própria família, surgiram casais homoafetivos sempre tratados com carinho. 

Fiquei sem saber o que fazer. Queria falar com alguém, mas com quem? Por que falar? Por que não deletar diretamente. Não teria absolutamente nada a perder. Receio de magoar a minha amiga virtual? Não, não era grave assim bloquear uma pessoa. E por quê? Ela poderia ter um perfil falso? Poderia. Poderia ser outra pessoa querendo aproximar-se de mim? Poderia.

Enquanto resolvo o que devo fazer, saio do Messenger e volto a procurar no face o perfil da jovem médica. Nada de diferente. Volto à minha página. Localizo o lembrete que fiz com o nome dela. Nada mais se encontra na página. Foi tudo deletado. Melhor assim, eu penso. Decido, finalmente, bloquear seu nome. Sim, faço isto. Quando vou ao seu perfil, toda a página encontra-se bloqueada e eu, que quase nada entendo destas coisas, fico meio perdida. Me deito. 

Apago a luz e rapidamente o sono me chega.

Esse Facebook!!!

*
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