Estou aqui, comemorando porque finalmente chegou a minha vez de tomar a primeira dose da vacina – sim, é hoje!!! –, quando trombo com uma matéria sobre um moço que arrancou a seringa das mãos da enfermeira, em um posto de saúde do Ceará, e aplicou o imunizante no próprio braço. Ele disse que ficou com medo de que a moça não lhe aplicasse a vacina. Eu só consigo pensar no nível de desamparo e desespero que estamos sentindo para um rapaz que já estava dentro do posto, prestes a receber a sua dose, ter um rompante desses. É muito tempo com a vida entre parênteses. São muitos mortos que não pudemos sequer enterrar. É muita falta de perspectiva. Muita dor represada que a gente não consegue deixar escoar e, quando vê, sai arrebentando o tecido frágil da sanidade mental.
Domingo passado, voltando da casa da minha mãe, passei pela Savassi e vi bares lotados de jovens que se acotovelavam na calçada e abraçavam-se, quase todos sem máscaras. Por um minuto, desejei que aquilo fosse um sintoma de que a vida havia voltado ao normal ou de que, talvez, toda essa história sobre um vírus mortal que se dissemina pelo ar tivesse sido apenas um distópico pesadelo coletivo do qual a gente finalmente despertava. Mas não era isso. A rapaziada – Ops! “Rapaziada” é pré-cringe, né? – estava apenas querendo fugir um pouco deste pesadelo real que nos assola há mais de ano. Mas desconfio que eles não tenham combinado com o vírus.
Eu já me irritei bastante com as pessoas sem máscaras. Já tive ímpetos de arrumar uma briga por causa disso e acabei me segurando porque, numa rápida avaliação, acreditei que não seria prudente a troca de perdigotos que as discussões geralmente provocam.
Ultimamente, no entanto, tenho momentos de um pouco menos de irritação e um pouco mais de compaixão. Não zelar pela vida do outro pode ser sinal de egoísmo. Mas quando a gente chega a colocar a própria vida em risco porque não suporta mais o isolamento, o rosto coberto, a falta do abraço ou o minuto que falta para receber um imunizante que pode nos aumentar a esperança, isso me parece sinal de desalento que de autocentramento.
Em lugares onde as pessoas sentem-se um pouco mais amparadas, talvez seja mais possível ter paciência para aguardar que a enfermeira aplique a vacina no braço, talvez seja mais natural pedir que os abraços ainda aguardem um pouco ou que as máscaras ainda permaneçam nos rostos. Talvez a vida ainda pareça um bem mais precioso. Aqui os dias andam difíceis. Mas essa gente que saiu às ruas no sábado me faz ter um pouco mais de esperança em tempos melhores. Por favor, usem máscaras. Eu quero crer que a gente vai sair desta.
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