Guilherme Scarpellini
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Na carência de estadistas brasileiros — notadamente, nas esferas estadual e federal — adotei uma governante estrangeira para chamar de minha: Angela Merkel. Desde então, passei a acompanhar com rigor a atuação da primeira-ministra alemã no enfrentamento da peste em seu país.
Assisti a um pronunciamento recente, em que Merkel conclama que a população da Alemanha se resguardasse até a noite de Natal, quando, inevitavelmente, as famílias deverão se reunir em volta do peru e do arroz com uva passa — se é que os alemães cometem tal atrocidade gastronômica.
Traduzindo para a realidade de onde o Freddy Krueger está no poder: a única forma de passar o Natal em segurança é assistindo a “Esqueceram de Mim 2: Perdido em Nova York”, tomando uma taça de vinho, estirado no sofá, na companhia única e exclusivamente do mozão, isto é, do seu cobertor.
Em síntese: cancelem o Natal.
Batendo mil mortes por dia e com os hospitais abarrotados, qualquer evento familiar que implique em troca de presentes, discurso do tio bolsonarista e abraços e beijinhos de fingimento, ou seja, o tradicional Natal em família, seria nada menos que um suicídio coletivo.
Já mandei avisar aos meus parentes: eu não tenho vocação para Jim Jones, o psicopata americano que induziu o autoextermínio de 900 pessoas, em 1978. Por isso mesmo, defendo que as famílias deveriam cancelar o Natal. No entanto, como não houve adesão por parte da minha, eu seria hipócrita em dizer que não vou.
Eu vou. Mas vou ressabiado, desconfiado e contrariado. De mau humor, não quero saber de árvore de Natal, de peru de Natal, de presente de Natal. Quero mesmo é que termine logo o Natal — e todos sãos e salvos.
E quando tudo estiver terminado, eu cantarei “adeus Ano Velho”, abraçado a uma garrafa de uísque.