Todas as vezes que falo sobre suicídio, como fiz na semana passada aqui no blog, muitas pessoas me questionam sobre como abordar o tema em seu cotidiano. Como lidar com a questão da morte voluntária com aqueles que estão ao redor?
Inicialmente, o que chama atenção é o fato de que o suicídio parece estar sempre distante para nós. Não é um fenômeno para o qual haja uma representação mental para a grande maioria das pessoas. Ele passa a existir na concretude do ato. E nos deixa perplexos. E nos encontra desprevenidos. O estigma e tabu também pesam em invisibilizar a questão, o que dificulta a abordagem.
Sempre me sinto gratificada em poder responder aos questionamentos e contribuir para que o Setembro Amarelo não seja somente uma data, mas que possa aproximar tais reflexões – essencialmente humanas – para o dia a dia. A data é apenas um simbolismo de alerta para o que acontece o ano todo. Como disse nossa colega, Morfeu não tira férias e, neste caso, vem com ajuda de certa ambivalência e sofrimento.
Na verdade, as respostas à questão de como lidar com a temática da morte voluntária não são simples e não podem ser dadas como “receita de bolo”, sob pena de buscarmos causalidades inócuas ou cairmos em reducionismos incapazes de apreender a complexidade do fenômeno. Devem ser construídas na singularidade de cada caso, através da escuta sensível.
Elas passam pela sensibilidade de acolher e escutar o sofrimento do alheio. Nossa, e como isso é difícil. Difícil porque vivemos sem tempo, olhando para os nossos próprios umbigos. Difícil porque o sofrimento quase nunca vem explícito, claro. Ele se mimetiza nas entrelinhas do discurso, ele se esconde na potência das criações artísticas.
As pessoas não dizem: “vou me matar amanhã”. O sofrimento está escondido em frases do tipo: “eu não tenho mais saída”, “estou cansado de viver”, “não vale a pena continuar vivendo assim”, “queria poder dormir e nunca mais acordar.”
Essas falas precisam ser ouvidas, acolhidas, traduzidas e, se necessário, vinculadas a um serviço de saúde. Por trás delas há um sujeito que sofre e não consegue verbalizar um pedido de ajuda. Precisamos nos deixar afetar pelo sofrimento do outro, para que o cuidado, a empatia e a solidariedade aconteçam sem julgamento e sem soluções “mágicas”. Mostrar o nosso lado humano também ajuda, pois abre um canal de comunicação verdadeiro: “Olha, eu já passei por isso”.
Assim, pouco a pouco e na presença do outro, o sofrimento pode ir sendo drenado e encontrar outras vias para ser simbolizado, canalizado, ressignificado, para além da via da passagem ao ato.
A literatura médica diz que o suicídio é uma emergência médica. Eu costumo dizer que o suicídio é uma emergência existencial. No final das contas, é sempre a balança da vida nos questionando sobre o sentido: “para quê viver?”.
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