Sobre a guerra

Minha bisavó tinha a pele escura. Ela mal falava português. Usava palavras em árabe quando precisava dizer alguma coisa mais complexa.  Seus cabelos eram pretos e longos, e não brancos como os das bisavós normais. Ela tinha os olhos fundos com olheiras. Era magrinha e usava vestidos de algodão. Lembro-me dela, apesar dela ter falecido quando eu tinha 9 anos. Uma vez, entrou um boi … Continuar lendo Sobre a guerra

Orquídeas

As orquídeas daqui de casa floriram em setembro. Todas elas desenvolveram botões que desabrocharam em flores. Na maior parte do ano, elas são hastes vazias, depenadas. Parecem mortas, hibernantes, não fossem as folhas verdes e largas de sua base. Um dia, elas formam botões que evoluem para um espetáculo de pétalas. Este dura pouco tempo. Dois meses, algumas semanas. Para depois adormecerem novamente. Há muitas … Continuar lendo Orquídeas

Pauline

Em 2009, Leo e eu nos mudamos para Paris para estudarmos. Leo iria fazer um curso de gastronomia na escola Ferrandi e eu consegui um estágio de neurologia infantil no hospital Kremlin-Bicêtre. Ao conversar com o chefe do serviço, ele me orientou estagiar nos mesmos termos que os acadêmicos. Eu já era médica, mas não poderia prescrever. Apenas entrevistar, evoluir os pacientes e participar das … Continuar lendo Pauline

Mariah

Tudo começou num Carrefour, o supermercado. Havia um no shopping que era enorme. Vendia de requeijão a pneu, passando por barracas de acampamento, pequenos móveis e cds. E foi diante desses que parei, um dia, para escolher um presente de dia das mães para a minha mãe. Ela sempre gostou de música, mais precisamente de jazz e R&B. Fuçando as sessões divididas alfabeticamente, encontrei uma … Continuar lendo Mariah

Quebra de decoro

Esta semana, o vereador Gabriel Azevedo, presidente da Câmara Municipal de Belo Horizonte, teve o projeto de cassação de seu mandato aprovado em assembléia. A alegação principal e mais grave de seus oponentes é que ele incorreu em “quebra de decoro parlamentar”. Tive a oportunidade de conhecê-lo há alguns anos e venho acompanhando-o pelos jornais e pela rede social. Como cidadã, sinto-me muito bem representada … Continuar lendo Quebra de decoro

Pressão

Eu nunca soube cozinhar. Porém, dez anos atrás, ganhei de Natal uma panela de pressão. Estava grávida de meu primeiro filho. Pensei que nela poderia preparar as papinhas quando chegasse a hora dele aprender a comer.  Era a panela mais bonita que já tinha visto. Grande, reluzente, de aço inox, com uma válvula roxa para o escape do vapor. Colocava nela água e uma porção … Continuar lendo Pressão

Vaga

Queimei a mão assando batatas doces no forno. Está doendo. Não sei se passo pasta de dente ou Hipoglós, vou decidir quando chegar em casa. Estou no estacionamento do supermercado onde parei por um minuto após fazer as compras. A sopa congelada começa a derreter no meu porta malas. Em breve, chegarei para guardar tudo nos seus devidos compartimentos e começar a preparar o jantar. … Continuar lendo Vaga

Amiga

Taís Civitarese Fiz uma amiga por um único motivo. Uma vez, pisei na bola com ela.  Ao invés de me odiar e romper a amizade, ela nada fez. Continuou a me tratar normalmente, com a mesma amizade de sempre.  Onde eu esperava raiva, encontrei paz. Onde esperava rancor, encontrei leveza. Onde senti medo, encontrei um sorriso. E nossa conversa continuou do mesmo jeito. Somos amigas … Continuar lendo Amiga

Antipatia semântica 2

Cá venho eu contar sobre mais duas palavras que me causam irritação. O interesse nesse tópico não cabe a ninguém além de mim mesma, porém compõe o rol das inutilidades que, por uma razão ou outra, preciso dividir. Na falta de um ouvido mais próximo, o imbróglio coube a você, amigo leitor. 🙂 Lembrei-me de tais verbetes por motivos diversos na semana passada e, ao … Continuar lendo Antipatia semântica 2