Mário Sérgio

Imagine aquela vontade enorme de dançar, participar daquela fila de amigos ao ritmo dos surdos, tamborins e cuicas. Ah! Que delícia arriscar passos de frevo erguendo uma sombrinha imaginária, colorida e foliã. Atrever-se a trançar as pernas e pés na dança ligeira que encanta turistas estrangeiros que nos visitam nesse período de festa.  Equilibrar com galhardia um largo sorriso no rosto enquanto gira com seu par, também feliz, entre serpentinas e confetes. Toda a energia de felicidade e conspiração pelo bem que tais momentos inspiram se revestem dos destaques, das fantasias. As brincalhonas, por puro deboche; as engajadas, cujos manequins acreditam que vão salvar o mundo ou, no mínimo, o seu país; e ainda aquelas que reverenciam profissões, ídolos, personagens atemporais. 

Sempre faço esse exercício. Imaginar a folia com uma bela parceira quando, entre centenas de pessoas, milhares de vozes e gritos, apenas a sua beleza restasse entre a ofuscada imagem de todos os outros. E só o seu cantar, sobressaindo delicado e tranquilo entre a balbúrdia de outros tantos que eu não veria nem ouviria. 

Tratar desse tema me remete ao espetacular samba da Escola do coração, Mocidade Independente de Padre Miguel, que, em 1992, ficou em segundo lugar no desfile das escolas de samba do Rio. Foi uma injustiça, pois certamente merecia o primeiro lugar: “Sonhar não custa nada – ou quase nada” de Paulinho da Mocidade trata de sonhos e da emoção de valorizar um projeto desde sua formulação. Inclusive observando que, por se tratar de sonho, de expectativa, que seja colocado no ponto mais elevado; que seja tão grande quanto nosso pensamento possa vislumbrar. 

A poliomielite, ou como também é conhecida a patologia, Paralisia Infantil, impõe severos limites àqueles que sofreram suas sequelas. Desta forma, me cabe apenas sonhar qualquer alegria que dependa de pernas e pés funcionais. E perseverar na luta para que esse mal não volte jamais a afligir as nossas crianças. 

Com esse afã e cheio de emoção por assistir pela primeira vez o desfile de minha Escola querida, estive na Passarela do Samba, no Rio de Janeiro. Quem não teve ainda a oportunidade de assistir ao vivo, eu recomendo muito. O som da bateria, o ritmo compassado e delirante, as paradas criadas pelo grande Mestre André, claro, da Mocidade, exortam um estado de alegria e conexão com toda a beleza e bem-querer de que nosso coração é capaz. As baterias de todas as escolas têm o condão de nos fazer levitar, como se a leveza que a alma alcança fosse tal que suportasse nosso corpo enquanto se eleva entre paetês e lantejoulas, entre os gigantescos e espetaculares carros alegóricos.

E passa a primeira escola, com seu samba-enredo envolvente. E seguem-se outros cortejos magníficos, com mestres-salas e porta-bandeiras, alas reluzentes e vida em forma de música. É quando a suave mão da minha imaginação se estende a mim, que me encontro entre a sola e o salto de uma sandália dourada, num convite: “Vamos! Hoje é dia de folia!”

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