A dor me apresentou as palavras 

Silvia Ribeiro

Na adolescência a dor me apresentou as palavras.

Incrivelmente elas vieram pelas vias da morte/sofrimento. A partida do meu pai abriu um espaço no meu peito pra que elas entrassem e conhecessem a minha intimidade. Coisa que eu não havia combinado com a vida.

O lápis deslizava com importância e as palavras não se incomodavam com o sal das minhas lágrimas molhando o papel. Ele só queria saber de mim, ouvir o meu coração e me deixar menos oca por dentro.

Prestava atenção nos meus desaforos, nas minhas blasfêmias, na saudade que havia virado um fantasma e na inocência que do dia pra noite deixou de existir. A princesinha do papai também tinha ido a óbito.

Senti algo gemelar nesse encontro com as palavras, como se eu não fosse mais capaz de seguir sem elas. E me separar de qualquer coisa naquele momento era algo que o meu coração não suportaria.

Então seguimos numa busca que vai além do físico e se conecta com uma centelha divina, uma vontade de falar de mim e do mundo, de nada e de tudo. Uma força que canta, que reza, que ilumina e que cura. E sobretudo, que agradece.

Hoje falamos sobre o que a nossa intuição pede. Contamos quando eu me apaixono e quando desapaixono, choramos quando lembramos de alguns adeuses, e rimos por qualquer besteira que eu cometo.

Gostamos de falar de amor e de sexo sem massificar o sentimento, damos individualidade aos desejos, passamos de coadjuvantes a protagonistas sem perder a elegância.

Tem dias que a gente invade as histórias de outras pessoas dando uma versão pessoal a elas, sem mudar a sua verdadeira essência e nem macular o que foi vivido.

Ou até mesmo expomos as nossas recordações e vivências que o tempo não amarela, e nem é engolido por traças famintas. Usamos os amassos da escola como tema e os fora que levamos desvencilhamos. E sentimos um prazer delicioso quando entramos nas emoções de alguém.

Não sou “Silvia” sem as palavras. Sem elas não tenho rosto, não tenho alma, não tenho coração.

E assim continuamos…

Plenas e lindas!

PS: Na minha infância adorava aquele macarrão de letrinhas. Acho que isso deve explicar alguma coisa. Risos

4 comentários sobre “A dor me apresentou as palavras 

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