Daniela Mata Machado
“O Reiki é flexível como bambu.” Quem diz é o meu mestre Bern Hard Roessman, responsável por me iniciar nos três graus do Reiki e também no mestrado. Mas quando recebi essa energia pela primeira vez, tudo o que eu tinha era uma rigidez atávica. E talvez aquele tenha sido o meu primeiro contato com alguma flexibilidade. Era um momento traumático que, no fundo, eu já sabia que acabaria botando um ponto final numa carreira que eu jamais havia pensado em encerrar. Era mais que isso, na verdade. Aquele era um momento que botava em cheque toda a minha história, tudo o que eu havia construído e tudo o que eu acreditava que constituía meu tudo. Eu já tinha sobrevivido a muito mais que isso, mas a carreira de jornalista era a última âncora em que eu podia me agarrar. E não é fácil a gente largar a última âncora.
Naquela sessão, a terapeuta, que eu visitei uma única vez por recomendação de uma amiga, dizia que a energia estava muito forte, mas eu não sentia nada. Eu tinha espasmos como se uma corrente elétrica estivesse ligada sob os meus pés, mas nada do que ela me dissesse faria muito sentido porque eu só pensava em todo o arcabouço de racionalidade que havia erguido para sustentar as emoções que passei uma vida inteira tentando represar (fracassei miseravelmente, inúmeras vezes, é preciso sublinhar).
Depois daquela sessão, só voltei a receber Reiki quando, já resignada com o fim da minha carreira de repórter, entrava em crise após uma escolha complicada, que me violentava mais que o suportável. Menos resistente, nessa segunda vez eu me entreguei ao Reiki e percebi o quanto aquilo me fazia bem. Voltei algumas vezes e sou extremamente grata a essa terapeuta que me ajudou a respirar nos momentos em que me faltava o ar.
O Reiki me abriu um portal para a menina que eu tranquei no fundo de um baú, enquanto tentava organizar os conceitos que me explicavam o mundo e as coisas do mundo. Conceitos cuidadosamente sobrepostos uns sobre os outros, de modo a emparedar toda a energia com que eu jamais havia aprendido a lidar: os sonhos premonitórios, a náusea que sempre precedia os piores acontecimentos, os arrepios em certos lugares e o mal-estar diante de algumas pessoas. Fui racionalizando tudo, de modo a manter trancado e sob controle o que jamais pôde ser controlado.
Na noite da minha iniciação no Reiki 1, tive muita azia. Passei mal a ponto de não conseguir dormir. Me lembrei de que em todas as vezes que havia recebido o Reiki eu havia sentido azia (e não, isso não faz parte do meu repertório de sintomas habituais). Mas naquela noite fiquei tão mal que achei que não conseguiria fazer o Reiki 2 no dia seguinte (sim, eu fiz as duas iniciações em um único fim de semana). No dia seguinte, entretanto, apesar de quase não ter dormido, eu estava zerada.
Mas o Reiki ainda faria muito mais por mim. A partir daquelas duas iniciações, eu comecei um mergulho interno muito mais profundo do que jamais me entendi capaz de fazer com tanta leveza e desprendimento. Depois de uns seis ou sete meses, decidi que era hora de fazer o Reiki 3 e foi como se me prendessem a um torpedo, capaz de me lançar ao centro de todas as minhas questões. Mergulhei tão profundamente que me senti capaz de respirar debaixo d’água.
O Reiki me deu acesso aos lugares que, durante anos, eu me proibi de visitar e até de reconhecer-lhes a existência. E me ajudou a lidar com a perda de todas as identidades sem as quais eu acreditava que não sobreviveria. Foi por isso que mais tarde decidi me tornar mestre. Para passar adiante. Abrir espaço para a energia do Reiki me abriu um portal para um universo fluido, onde cabe espaço, onde cabem escolhas e cabe também o silêncio. Ele chegou à minha vida no momento em que eu acreditava que não existiria fora das escolhas que já tinha feito e que constituíam a minha identidade. E me mostrou que é possível existir muito além das identidades.