Categories: Taís Civitarese

As postagens e o vazio


Não deve ser fácil ser jovem hoje em dia. Como encontrar motivação para estudar e vislumbrar uma carreira em tempos de influenciadores falando montes de besteira e embolsando milhares de reais no instagram?

Quando atores, cantores e modelos faziam publicidade, era mais fácil de compreender essa dinâmica. Eram artistas que agregavam a projeção atrelada a sua fama, talento ou aparência à imagem que um produto gostaria de ter. Revertendo-se para o mundo da influência digital, são pessoas que trocam a exposição de parte de suas vidas e a constância em se comunicar pela possibilidade de angariar espaços publicitários. Troca essa com potencial de ser altamente rentável.

Acredito que o que esteja sendo verdadeiramente oferecido como escambo na internet sejam alternativas à solidão do espectador. A certeza, para quem acompanha, de que haverá um post, uma informação, um “story”, uma foto. A furtiva sensação de conexão e de compartilhamento de momentos.

Isso me faz refletir sobre o quanto somos sozinhos. A companhia – ou a ilusão da mesma – tem sido a mais valiosa moeda de troca de nosso mundo. Quem oferece um sinal de presença ou “a si mesmo” é buscado, seguido e consequentemente, patrocinado.

No pacote do voyeurismo embarca frequentemente a divulgação de informações equivocadas. Porém, isso não parece ter a menor importância. Até os que nada fazem de especial têm seu mérito: estarem sempre ali. Têm voz, imagem, cores, forma. E isso, para muitos de nós, é melhor do que encarar o vazio.

Nossa solidão é a pedra motriz de toda essa estranha engrenagem. Juntamente à falta de crítica. Tememos o vazio e tratamos de tamponá-lo com sequências de imagens e barulhos rasos. Isso só faz aumentar a erosão de nossos sentimentos. Além de nos dar uma visão completamente editada do mundo (não é possível que a vida alheia seja assim tão interessante!). Se ao invés, preenchêssemos o tempo com estudo, aprendizados, leituras, reflexão e momentos não-instagramáveis, teríamos menos medo de nós mesmos. Teríamos de fato “conteúdo” e solidez. Possivelmente também, por consequência, seríamos devolvidos a uma realidade muito mais interessante.

Tais Civitarese

Share
Published by
Tais Civitarese

Recent Posts

Sorriso

Mário Sérgio Difícil encontrar empregos naqueles tempos. O assunto em televisão, rádio e jornal, era…

4 horas ago

Mãe

Rosangela Maluf Ah, bem que você poderia ter ficado mais um pouco; só um pouquinho…

10 horas ago

O morro dos pensamentos fluentes

Tadeu Duarte tadeu.ufmg@gmail.com Moro em uma região de baixa altitude da cidade, a um quarteirão…

1 dia ago

Simplesmente

Peter Rossi Nada melhor que uma boa sesta, estirado no sofá da varanda, depois de…

1 dia ago

Bate e volta em Dubai

Wander Aguiar Talvez eu nunca mais consiga tal proeza, mas sim, meus queridos leitores, eu…

2 dias ago

Indecências

Ando exausta com a hipocrisia. Exausta com quem profere a frase “moral e bons costumes”.…

2 dias ago