O inquilino

Um dia, a banana amanheceu comida. A culpa recaiu sobre o cachorro. Nosso cão parece um híbrido de canídeo com gato. Ele salta, sobe nas coisas, chega a ronronar. Passa o dia roendo algo. Devia ter sido uma de suas travessuras.

No outro dia, aconteceu igual. Latidor ousado, pensei. ‘Talvez sejam ciúmes porque não lhe demos atenção naquele dia’. Para comprovar minha hipótese, joguei-lhe uma banana intacta. Ele permaneceu imóvel. Coloquei-a ao lado do seu osso favorito. Ele ignorou ambos.

Aconteceu pela terceira vez. E comecei a sentir algo de estranho. Desta vez, a janela da sala tinha passado a noite aberta. “Foi morcego!”, suspeitou alguém.

Não queríamos acreditar na possibilidade mais provável. Era verdadeiramente repugnante. Porém, tivemos que começar a procurar seus indícios. Perto da fruteira não havia nada. Nem em nenhum outro lugar da casa. Nenhuma pista.

A Val resolveu arrastar o sofá. E viu que um pedaço dele estava roído. Embaixo, pequenos caroços lembrando grãos de arroz preto. Fezes de rato.

Estava feito diagnóstico. O pânico tomou conta. Que nojo! Rato! Doença! Sujeira! Morte! Leptospirose! Bicho horroroso! Onde estariam?

Mandamos lavar o sofá e proceder a toda uma descontaminação do lar. Lavamos os alimentos, jogamos os que estavam abertos fora. Foi álcool em tudo, vinagre, dentes de cravo, aspiração e armadilhas.

Deixamos o ‘cola-rato’ umas quatro noites perto das bananas e em outros cantos da casa. Nada. Nenhuma pegada ou mordidinha. “Devem ter ido embora”.

Val quis rasgar o fundo do sofá por baixo. Assim, caso voltassem, não teriam mais esconderijo. Fiquei apreensiva. Deitamos o móvel, visualizamos seu fundo revestido de tnt. Com uma faca afiada, ela cortou o tecido do lado esquerdo. Vimos muita poeira e toda a estrutura do sofá por dentro. Começou a deslizar a faca pelo lado direito. O cenário estava diferente. Tecido roído, partes de espuma, linhas e fios embolados, serragem. E aí, ele apareceu. Um rato enorme. Sobrenatural. Resistente. Morando dentro do sofá da nossa casa. Ela cutucou-o com a vassoura e nada. Bateu mais forte e ele saiu correndo. Fugiu pela porta aberta em direção à rua.

Por semanas, tivemos esse inquilino indesejável dormindo bem abaixo de nós, num raio de poucos centímetros de distância. Separado apenas por um estofado em franco processo de destruição.

O cão assistiu a toda a cena, imperturbável. Definitivamente, não é um cão que se preze. Tampouco, gato.

 

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