Lições da natureza

Peter Rossi

 

É incrível como a natureza, diuturnamente, nos dá exemplos de vida. Pra qualquer olhar que miremos, lá estará uma atitude tomada, um exemplo a ser seguido. Mas, rasos que somos, por vezes não conseguimos perceber.

Quanta tenacidade do curso d’água a desenhar no chão o próprio caminho, criando pontes imaginárias e desvios precisos e preciosos. Numa brecha, entre uma pedra e outra, o riacho encontra a saída, não sem antes cuidar da pedra, alisando-a anos à fio, a permitir o escoamento necessário.

E assim, com obras de engenharia, a natureza deixa o curso natural das coisas seguir. A água contorna daqui e dali, deixando nas margens, jardins e celeiros naturais.

As árvores, essas então, as mais sábias. Nascem contornando umas às outras, sem qualquer importunação, em busca de uma nesga de sol. Tem espaço pra todo mundo, é só ajeitar…

Com as raízes não é diferente. Caminham solo adentro, desviando de pedras e muros, e achando o aconchego para se nutrir. As árvores nunca reclamam, ao contrário, sempre são agradecidas e, em troca de espaço e sol nos dão a vida.

E são vários os exemplos. Nós, cegos e esquálidos de razão, não percebemos. O medo que os animais sentem, por exemplo, acaba sendo absolutamente racional, afinal somos nós os verdadeiros predadores. Temos a inconsciência de matar pelo simples prazer … de matar. Os animais não compreendem tal conduta, mas, certamente, com faro apurado, sentem que o cheiro ali não é de coisa boa, por isso sempre se escondem.

Sol e lua se revezam, cada um a encontrar soluções para ajudar de uma forma ou de outra. As marés, nos oceanos, sofrem alterações, o solo se mostra mais disposto a receber a colheita e a chuva cuida de abastecer o nascimento de novas vidas. Tudo rigorosamente cronometrado. E aí aparecemos nós a bagunçar a coisa toda. E somos tão imediatistas que não medimos as consequências em nos colocar como algozes e vítimas. Dúbio sentimento sem sentido. Não há entre nós o instinto de preservação em sua completude, apenas a satisfação momentânea do medo do desconhecido. A nossa ação é uma reação à nossa inconsciência, essa é a mais pura verdade.

Estivéssemos nós enraizados no conhecimento das coisas e perfeitamente inseridos na natureza, deixaríamos de nos portar como simples hóspedes aventureiros, acreditando que pagar a conta do hotel seria nossa absolvição dos pecados.

Pura incongruência, demência até ao não enxergar um palmo adiante do nariz. A natureza, ela não precisa de voz e holofotes, ela pede apenas paciência e respeito, nada mais. Se não atrapalharmos, estaremos ajudando.

Mais uma vez tendo as árvores como exemplo: o velho galho que cai é o prenúncio de que nova vida virá, mais plena e forte. As folhas expulsas pelo outono, guarnecem o chão e criam o alimento das raízes. Tudo em absoluta sintonia.

E nós, mais uma vez e sempre, atônitos idiotas a fingir que entendemos tudo. De nada sabemos. Séculos de observação de nada serviram. E a ciência, todos sabemos, sobrevém da observação, desde tempos remotos. Nós, de tempos para cá, nos consideramos cada vez mais inteligentes, porém desprezamos as origens. Agindo assim, somos estéreis objetos de nossos devaneios, tolos pensamentos úmidos de pompa e circunstância. Do alto de nossa altivez, não percebemos quão pequenos somos.

Precisamos nos despir dessas fantasias e procurar, além dos sinais, novos rumos de integração. O ser humano é natural e assim precisa se entender. Precisa se permitir imaginar que não está na disputa de pódio algum. Ao contrário, precisa mais de abraços que de braços, mais de apoio, que de pés. Mas de sonho, do que medos.

Devemos aprender com as árvores e podar nossos preconceitos. Acomodar nossa existência como mais uma na escala de coisas. Somos uma parte, jamais um todo. Instrumentos, jamais contexto. Pincéis, apenas pincéis. As cores, essas sim estão ao nosso redor, como flores a inebriar nossas emoções e nos fazer entender que menos é mais. Os tons são os necessários, as nuances, algumas.

E quando, finalmente, a humanidade entender sua posição nesse painel que é a vida, nos permitiremos florir, gerar novas cores e sensações e, mais que isso, nos fazer imortais, deixando que as nossas folhas, caídas como lágrimas de nossos olhos, povoem o chão abaixo de nós.

O mundo, assim, será melhor, muito melhor!

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