Onde fica a porta da rua?

Silvia Ribeiro

Entro dentro do meu quarto e uma caixa parece ter sido esquecida em cima da minha cama. Aquele objeto me é estranho, mas ainda assim sinto que devo saber do que se trata.

Ao abri-la fico confusa.

Aromas entram pelas minhas narinas, vozes se desembrulham dando a entender que são um presente, olhares atravessam os meus olhos e eu me preparo pra reconhecê-los.

Quantos mistérios vivem ali dentro sem que eu me desse conta. O meu sorriso vê tudo aquilo de uma janela sem poder tocar, e nesse momento cuido de ser cordial com todas aquelas imagens até que uma saudade forasteira me convida pra ir à algum lugar, mas eu não sei o que dizer.

Retomo o fôlego e quero logo saber porque tudo aquilo parece tão estático, porque o tempo não se movimenta, porque à alguns dias atrás corria sangue naquelas histórias. E se não tem mais festa, quem foi que apagou a luz?

Até que:

Como vai?

Não tenho muito tempo pra todas as suas respostas, já estou velho e ando um tanto cansado. As minhas pernas não me acompanham, a minha voz não quer mais ser criança, e sei que logo uma luz virá me buscar, os meus dias por aqui não foram fáceis. E acredite: não posso fazer mais nada por você.

Em certos lugares as pessoas estrategicamente querem que eu vá sem sequer dizer adeus e desejam nunca ter me conhecido, outras já costumam se emocionar com a minha partida e me guardam no coração. Mas, pra maioria logo eu cairei no esquecimento.

Olha! Aquela caixa em cima da sua cama é um presente meu pra você, ali eu deixei todos os momentos que passamos juntos.

As alegrias que eu desejei pra você, os sonhos que eu te apresentei, as feridas que eu cicatrizei, os amores que eu coloquei na sua porta, os amigos que eu te ofereci, os pecados que eu fingi que não vi, a fé que te tornou mais forte,e as despedidas que eu não pude conter. Lá, eu fui o melhor que eu pude, e me perdoe caso eu não tenha cumprido a minha missão.