Taís Civitarese
Paulo tem 14 anos. É gentil, alegre e inteligente. Ele ajuda seus pais na loja que têm no centro da cidade. Às vezes, os clientes o olham estranho. Ele não liga enquanto aprende a se tornar um bom vendedor. Paulo nasceu Paula. Mudou a última letra de seu nome porque se sentia melhor assim.
A mãe de Julio teme que ele seja agredido na rua. Ele tem apenas 12 anos. Gosta de dançar e vestir-se com as roupas dela quando está dentro de casa. Tira boas notas e quer ser cantor. Sua cantora preferida posta muitos vídeos no Youtube. Enquanto assiste a eles, Julio sonha. Ele é apenas o Julio.
A tia de Marina proibiu que ela andasse com sua amiga lésbica. Ao médico gay ela conta essa história.
Os padrinhos de Henrique querem que ele se mude de casa porque desconfiam de sua orientação sexual. Henrique tem 17 anos e acabou de passar no vestibular para cursar o que mais queria em uma faculdade federal. Seus padrinhos são pessoas caridosas e participam de grupos de oração. Seus padrinhos querem pôr Henrique na rua.
Tirando os nomes, essas histórias são reais. Foram observadas em um contexto de atendimento em saúde mental da infância e da adolescência. A partir delas, percebemos que ainda não estamos preparados para sermos uma sociedade acolhedora. Será mesmo que defendemos nossas crianças? Será mesmo que sustentamos o valor do que é ser uma família? É preciso dar um passo atrás e refletir. Mudar dói. Mas é uma dor bem menor que a da morte, a do remorso ou a da injustiça.