Taís Civitarese
Acho muito interessante quando surge uma notícia que revira o passado de alguém e encontra um podre da pessoa. Uma fala enviesada ou uma opinião polêmica de 1989 voltam aos holofotes e se tornam atuais como se fossem de hoje, como se tivessem saído da pessoa que existe hoje, mais de 30 anos depois.
Muitas vezes, os autores são achincalhados e descredibilizados em sua totalidade como se aquilo necessariamente ainda lhes pertencesse, como se toda água que rolou por baixo da ponte ao longo de 30 anos não tivesse servido para nada. Não tivesse mudado o rumo dos pensamentos.
Em 30 anos quantas pessoas aquela pessoa já foi, quanto já viveu, aprendeu, sonhou, se aborreceu, deduziu, entendeu. Não é possível que sua existência de agora seja desvalorizada por palavras antigas, as quais podem ser revisadas já no segundo seguinte à sua profeção.
Há quem não mude mesmo. Pessoas que continuam as mesmas, apenas menos metabólicas. Não nego que conheço exemplos assim. Porém, há aqueles que mudam, que reavaliam suas impressões, que fazem valer todo o oxigênio inspirado para arejar as ideias e amadurecerem, tais como as frutas que se enchem de ésteres e polifenóis.
Há os que justificam os esforços da natureza, ou a própria natureza da natureza, revestida de renovação, ciclos e renascimento. Os que repensam.
E há os cabeça-dura que simplesmente se recusam a acatar novas ideias, que se robotizam naquilo que consideram ser certo e impedem o acesso a qualquer luz e estímulo em suas convicções petrificadas, como se aquilo lhes ancorasse de alguma maneira à realidade, como se fosse um lastro.
Admiram-me os navios que vagam com as âncoras suspensas rumo à exploração do entorno e não se importam em sacudir, balançar e até perder o rumo às vezes, desde que encontrem, após alguma perseverança, um novo horizonte, uma nova paisagem a ser contemplada e amada, tanto ou mais que o porto anterior.
A rigidez de ideias me apavora e quem me dera não ser igual eu era ontem e muito menos permanecer como hoje no amanhã.