Daniela Mata Machado
Foi no pátio da escola que eu conheci a madrinha da minha primeira filha. E nós tínhamos apenas 14 anos – a idade que a minha menina tem hoje – quando selamos uma promessa de que, se um dia tivéssemos filhos, uma ia batizar o primeiro da outra. Eu cumpri a promessa 20 anos mais tarde. Casei, descasei, me mudei de cidade, voltei, me casei de novo… e a amiga da escola nunca deixou de ser madrinha da filha que um dia eu teria. No dia do lançamento do nosso livro, Doze Horizontes – Um Mirante, ela estava lá, ao lado de uma outra amiga que eu também conheci na escola, há mais de 35 anos.
O nome da minha primeira filha é uma homenagem à professora do ensino infantil, que cursei em Campinas, no interior de São Paulo, e reencontrei graças às redes sociais, que às vezes nos trazem essas alegrias. Dora, a professora que eu nunca esqueci, veio à minha casa em Belo Horizonte para conhecer a Dorinha e esse foi um dos encontros mais ternos que eu já vivi.
Eu nem sempre me lembro dos conteúdos que aprendi na escola. Mas a minha vida nunca teria sido tão rica se eu não tivesse conhecido a diversidade de olhares e pontos de vista que só tive acesso porque passei por ali. Foi lá que eu descobri as mais diferentes visões de mundo, que percebi as injustiças e a importância das pessoas se unirem para se defender delas, que me apaixonei pela primeira vez, e pela segunda, e pela terceira… E notei que existem pessoas que nos fazem sofrer e outras que nos acolhem quando a gente nem gostaria de voltar para casa.
Eu aprendi matemática, me apaixonei pelo português, odiei geometria e tive uma imensa dificuldade para identificar aqueles risquinhos azuis que ilustravam os livros com os nomes dos rios que eles representavam. Ajudei os amigos a entender as matérias que eu sabia melhor e contei com a ajuda deles para compreender o que para mim parecia intransponível.
A minha mãe, apesar de não cumprir com os requisitos da legislação aprovada nesta semana pela Câmara dos Deputados para a introdução do ensino domiciliar no Brasil, teria sido uma tutora muito melhor do que eu, que cumpro os requisitos da lei. Aquilo que ela aprendeu, ela sabia ensinar e eu acho isso admirável. Ainda assim, se a ela fosse dado o direito de me tirar da escola para aprender em regime de homeschooling, e ela resolvesse achar que isso era uma boa ideia – não, ela não teria achado –, todo o futuro que eu tinha pela frente teria sido roubado.
Eu jamais seria o que acabei me tornando se não encontrasse professores tão diferentes da minha família, alunos com histórias de vida que jamais cruzariam com a minha e as amizades que ainda hoje me sustentam e me nutrem. Tudo o que aprendi, eu aprendi conversando com gente que muitas vezes nem sabia que estava me ensinando. A maior tristeza da pandemia, para as minhas filhas, era a ausência da escola, com toda aquela gritaria dos adolescentes e a correria das crianças desgovernadas. A maior alegria delas foi reencontrar, pouco a pouco, esse lugar que nos faz aprender a viver e nos entender com os seres diversos que há por aí.
Eu não seria capaz de roubar-lhes o direito de aprender longe de mim, de chegar a lugares onde eu nunca fui, de ouvir histórias que nunca me chegarão aos ouvidos e de pensar coisas que eu jamais ousarei pensar. Foi na escola que eu descobri que o mundo era grande. E eu não teria coragem de torná-lo pequeno para as minhas filhas.
Que texto maravilhoso!!! Quero compartilhar com Muitos e muitos….
Tomara as pessoas tenham um pouco de senso e não roubem das crianças e adolescentes esse mundo tão importante de ser vivido!
Bela reflexão! Defendo esse ponto de vista também. Escola é vida! É movimento! E eu, jamais “roubaria” do meu filho, os momentos compartilhados com os amigos, as suas gargalhadas ao me contar as suas vivências com os seus pares na sala de aula, no parquinho. E, os abraços e o EU TE AMO às suas professoras, além é claro, de CRESCER e SER , com crianças da sua idade.