Abraços

Peter Rossi

O menino caminhava pela estradinha de terra. Um sol quente na mochila. Chutava pedras aqui e acolá. Na cabeça a história que a professora dissera em sala de aula sobre o poder do abraço. A importância de abraçar, o que isso representa.

Não tinha convicção de ter aprendido qualquer novidade, afinal abraçar era um gesto comum, tão assim … coloquial.

Não via naquilo nada de especial. Era simples assim: olá, como vai? Então tá! Até logo, um abraço!

E assim foram tantos os abraços dados, outros desejados ao se despedir. Abraços ditos pelo telefone, pelo whatsapp. O menino achava aquilo tão sem sentido. Importância do abraço? Gente, mas isso acontece a todo momento. Porque abraçar é assim tão importante? Não acredito, se importante fosse ele já teria percebido, alguém, certamente, já teria lhe dito antes.

Bobagem! Abraçar é como dar “bom dia”, ou “até logo”. Essa professora viajou, pensava o menino.

Os anos passaram, entretanto. Muitos abraços foram dados, outros enviados, outros ditos no outro lado da linha.

E quantos foram escritos? Meu Deus, milhares!

Se pegou o menino – que agora não era menino mais, a pensar no que tinha dito a professora, naquela cidadezinha do interior.

Ainda não se convencera da importância especial do abraço. Se fosse menino, abraçava meio de longe, afinal eram dois homens, pensava. Se menina fosse, aí a coisa era diferente: o abraço durava mais, sentia um corpo no outro, mas também era só.

Essa professora devia ser muito carente! Abraçar é, antes de tudo, cumprimentar, um gesto formal e de urbanidade, nada mais que isso.

O relógio do tempo não parava. Muitos abraços se seguiram, todos no mesmo tom, na mesma trilha. Abraços em família. Abraços no trabalho, abraços na balada. Abraços de conforto, ombros molhados de lágrimas.

Abraços de chegada, abraços de despedida. Abraços formais, abraços sem forma alguma. Somente abraços, nada mais.

O menino – que menino não era mais, conheceu uma menina. Não uma menina qualquer. Uma flor, em forma de menina. E, para sua surpresa, ganhou dela um abraço. Na verdade, um grande abraço, apertado, longo, aquecido. Abraço de olhos nos olhos. Abraço em silêncio, abraço sem beijo. Só abraço, nada mais. Um abraço inesquecível, daqueles que merecem placa de comemoração.

O menino então descobriu do que falava a professora. No fundo pensou ter entendido exatamente o que lhe fora dito anos atrás.

Um abraço não é um gesto qualquer, é algo que agasalha a alma, que imanta os corpos a ponto de nunca mais se afastarem um do outro. O abraço que nunca tinha recebido era agora indispensável. Menino e menina, juntos, abraçados. Em silêncio, abraçados.

A cumplicidade do abraço faz com que corpos se unam, que olhares se nivelem, que bocas se procurem. O abraço nos faz mergulhar no fundo do outro olhar. Nos envolve, nos inspira, nos faz suspirar.

Abraço daqueles entrelaçados, que nos obriga a sentir o cheiro um do outro, nos impulsiona, nos emociona. Abraço que dura a vida inteira e abraçados, vemos a vida simplesmente passar.

Abraços de olhos fechados, vendo a vida numa tela de cinema. Abraço que se aperta até não mais parar.

Abraço sôfrego, impaciente, como se o mundo fosse se acabar. Abraço de precipício, que nos faz perder o equilíbrio. Abraço como um lápis sobre o papel. Abraço salpicado de estrelas. Abraço refletindo o brilho do sol, abraço de coração!

A professora tinha absoluta razão, o abraço é muito mais que um gesto de cortesia. Abraçar é trazer à tona uma cumplicidade que apenas dois corpos colados podem ter e, de tão envolvidos, se tornam um só!

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