Até hoje, me lembro daquele dia. O mais feliz da minha vida. Não, não foi no meu casamento. Nesta ocasião, estava tão cansada da odisseia de preparativos misturados a plantões – além de uma enxaqueca do cão -, que por pouco a noite de núpcias não foi suspensa por ordem de Morfeu…
O dia mais feliz da minha vida foi quando eu soube que tinha passado na residência no HC.
Nunca experimentei sensação igual. Nem no show da Mariah Carey (respeito se você rir…). Enfim, por uma glamurosa ironia do destino, este que, a bem da verdade, não tem glamour nenhum – aliás, detesto essa palavra ‘glamour’, deveras brega – eu estava em frente à Tate Gallery quando mamãe me ligou contando. Era noite. Saí correndo pela ponte Millennium, toda iluminada, feito uma louca. Lembro daquelas luzes, do frio, do que senti. Inesquecível.
A parte pouco brilhante da história é que eu não tinha passado na prova. Fiquei em quarto lugar excedente. Já tinha um honroso posto garantido em outro serviço. Mas eu queria o HC.
Uma de minhas frases favoritas do mundo é aquela de Blanche Dubois em “Um bonde chamado desejo”. Uso para tudo, várias vezes por semana, desde uma viagem de Uber até uma ida aos Correios: “Sempre dependi da bondade de estranhos”. Naquele dia, a bondade de estranhos também tinha me ajudado e quatro colegas aprovados haviam escolhido outros lugares para trabalhar. Abriu-se a minha vaga. Isso foi quase 15 anos atrás.
Até hoje, quando entro no HC semanalmente, me emociono. Vocês não imaginam o que é aquele lugar. Hogwarts ficaria no chinelo perto da quantidade de encanto, milagre e empenho que as pessoas executam por lá. É um porto de esperança, misturado com dor, tecnologia, esforço, ciência, humanidade e histórias, muitas histórias.
Lá, me formei e aprendi boa parte do que sei. Lá vi as coisas mais incríveis e mais tristes do mundo acontecerem. Foi onde, de fato, contemplei as maiores obras de arte desta vida. A arte da cura, do empenho, da competência, da doação, da solidariedade, da humanidade.
Ontem, meu tio se internou lá. E eu só espero que ele possa receber o tratamento – e também os milagres – operados pelas pessoas dedicadas de lá. Que os estudos, esforços e coragem da equipe médica atenuem essa loteria que o recobriu de um acaso indesejável… Eu sei que irão ao extremo tentar.
Hospital das Clínicas da UFMG. É o lugar que mais respeito no mundo todo e onde trabalham as pessoas que mais admiro.
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