Sandra Belchiolina
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“Toda gentileza é uma declaração de amor”, é a afirmação de Mia Couto que chegou num post do Facebook para mim. Outra veio na música: Todo Sentimento de Chico Buarque, e nela o refrão que carrega o sentir de muitos nessa atualidade dura: “Pretendo descobrir//No último momento//Um tempo que refaz o que desfez//Que recolhe todo sentimento//E bota no corpo uma outra vez.”
Li também um título da Revista Prosa Verso e Arte que me chamou atenção pela dureza: “Agora é preciso coragem para ter esperança”. É uma publicação de fragmentos sobre o livro: “Dar tempo ao futuro” de Mia Couto também. O escritor moçambicano relata sobre outra época, mas a provocação de suas palavras encontrou ressonância em mim e pensei nesse mundo de 2020 e 2021.
Fiquei instigada na frase “agora é preciso coragem para ter esperança”, é um paradoxo? Esperança é uma palavra que carrega o futuro em si. É esperança de algo num tempo futuro. E pensando sobre a coragem atual, se manter vivo e saudável é ser corajoso. É preciso ter coragem para abrir mão de recursos financeiros, afetos, lazer; para não ser contaminado pelo COVID-19, recriar-se não é fácil.
Há poucos dias fui fazer compra de supermercado e vi que um atendente estava sem máscara, solicitei que ele a colocasse. O fez, mas com uma irônica pergunta: está com medo? Respondi que estava morrendo de medo e principalmente porque estava com idosos. Acredito que a coragem de assumir que tem medo e que não quer isso para você e para outras pessoas é esperançar. A esperança está aí – você se projetando para o futuro. Vamos morrer com certeza, mas não precisa ser agora.
Ainda quero viver o tempo da delicadeza; no tempo que irá refazer os encontros e abraços de corpo a corpo, que converterá nele todos os sentimentos das nossas ausências físicas. Viver o tempo de receber todas as gentilezas e sejam elas: do fruto da terra, do mar, das matas e dos homens como um gesto de amor.
Temos de sonhar e nos reinventarmos!
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