Tais Civitarese
– Eu não sou louco. Não quero tomar remédio de louco! – diz o paciente de 11 anos.
A mãe, ao lado, consternada, sorri sem graça para o outro lado da mesa.
Fico pensando se existiria um remédio para a loucura. Se a loucura é que seria o remédio. Se dar aquele remédio não seria uma loucura…
O menino só aceita tomar medicação à noite. Prefere. De dia, se sente tonto. Não quer ter tonteira nenhuma na cabeça. Quer brincar, desenhar cavalos, mexer no celular. De fazer o dever, não gosta muito.
Peço para a mãe insistir com a consulta na psicóloga. A medicina tem seu limite. Não adianta só medicar, aumentar dose. Precisamos das outras terapias. Ele se beneficiaria de tantas delas. A psicologia seria um bom começo.
Ele não quer.
Alguém lhe falou que quem vai ao psicólogo é louco também. Explico que não. Ele insiste.
– Não vou e não vou!
Proponho um combinado. A mãe conseguiria a consulta e ele daria uma chance. Uma chancezinha. Iria uma vez. Se não gostasse, tentaríamos outra coisa. Falo que tem 11 anos. É bom ter alguém para conversar aos 11 anos, para contar as coisas. Alguém de fora, de confiança. A pessoa ouvirá suas dúvidas. Explicará algumas coisas.
Ele titubeia. Pensa um pouco e me pede:
– Quero uma coisa em troca.
Meus olhos arregalam e penso: qualquer coisa! Ele precisa ir. Faz seis meses que está na mesma. As mesmas queixas. Mesmas questões. Será um passo importante. É isso, mais do que tudo, que irá ajudá-lo.
Ele me pede:
– Quero que você escreva um bilhete para o meu pai.
– Um bilhete? Dizendo o quê?
– Para ele vir à consulta. Para saber do meu tratamento. Ele tem carro, tem dinheiro. Ele pode vir aqui um dia.
A mãe assenta com a cabeça. Terá sido ideia dela? Não acredito. Ele parece determinado.
– Escreva o bilhete para o meu pai.
Preparo a receita, o encaminhamento e termino as orientações à mãe.
– E o bilhete? – Ele pergunta.
Escrevo um comunicado para que o pai pedindo compareça à consulta de retorno, dali a um mês, para explicarmos sobre o tratamento de seu filho.
Ele sai da sala.
Fico me perguntando se aquele bilhete não seria o verdadeiro remédio.
As sutilezas do tratamento infantil esbarram em tantas profundezas, tanta vida. Dizem que é difícil tratar crianças porque elas não falam. Às vezes, falam mais do que qualquer adulto. Mais até do que nos permitimos escutar.