Victória Farias
Por um longo período no decorrer da história econômica do Brasil, o dinheiro, moeda corrente, objeto monetário de liquidez, perdia rapidamente seu valor. Não posso dizer por experiência, mas já fui ouvinte de histórias sobre corridas ao supermercado e aumento repentino de preços – na prateleira era um, quando chegava ao caixa podia ser o dobro.
A verdade era que todo mundo tava meio perdido. Ninguém sabia se gastava tudo em comida – porque, basicamente, era o que dava para fazer -ou se poupava, literalmente, à espera de um milagre. Se bem que o único milagre da poupança foi o do sumiço. Não me lembro de ter lido isso na Bíblia.
Foi uma troca de nome de moeda atrás da outra, sempre com a próxima valendo menos do que a anterior. Sempre. Mas, se você não era um homem engravatado enfurnado em um prédio do Ministério da Fazenda – primeiro no Rio de Janeiro depois em Brasília – não teria como saber disso. Então, ninguém te culparia se você fizesse uma besteira. Exceto sua família. E eu.
Se sucedeu que, certo dia, um homem teve uma ideia, que, para ele, parecia ser extraordinária. Ou, pelo menos, cabível. Numa dessas troca-troca de moeda, ele decidiu guardar certa quantia em um cofre. Decidiu também que seria razoável não contar isso a ninguém. Quando o valor do dinheiro voltasse a subir (o que até hoje não aconteceu) suas desculpas seriam aceitas e fariam sentido, levando em conta o extrato bancário.
Acontece que mão-invisível do mercado, principalmente naquela época, estava disposta a não deixar ninguém se safar. Esse homem, por doença, experimentou um longo estado de coma. Era tudo silêncio. Quando acordou, seis anos depois, o Real – que nada tinha a ver com a realeza (embora pareça) – já estava entre nós.
O homem, que esperava por um milagre econômico, colecionava, no melhor estilo acumulador, rios apinhados de novos cruzeiros. Nem o extrato bancário – inexistente – nem todas as desculpas do mundo conseguiram o perdão dele no Tribunal de Justiça dos Farias.
E é por isso, caro leitor, e pela veracidade dessa narrativa – colhida direto da fonte de histórias extraordinárias e mirabolantes da família – que pouco me apetece essa ideia de guardar dinheiro. Se os duzentos reais vem aí, eu prefiro comprar um pastel – ainda – por três. Do jeito que tá – e já adianto, não está nada bem – nunca se sabe quando um caldo de cana custará todo o meu salário.