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Ainda sobre vovó – a notícia

Taís Civitarese

Há muito tempo esperava essa ligação. Esperava sem esperar. Esperava para, depois que passasse, não ter que esperar nunca mais. Sabia que ela viria um dia e que não tardaria muito. Preparei-me.

Durante anos, meditei sobre como seria o momento. O que eu estaria fazendo. Quem estaria comigo. Pedi a Deus, sem pedir, que fosse suave. Que fosse leve. E menos traumatizante do que quando minha avó paterna se foi e recebi a notícia no colégio, no meio da aula, aos 10 anos.

A funcionária chegou dizendo que meus pais tinham vindo me buscar para viajar. Minha avó morava no interior. Estava no hospital. Não me falavam muito, mas na hora, eu soube.

Não há momento ideal para se ter notícia da morte. É sempre duro, sempre ruim. É sempre um mundo que acaba e outro que começa na hora. Mas a dela, eu sei que não aguentaria se fosse ríspida. Se viesse de maneira lancinante. Não poderia ser assim.

Dessa vez, esperava que tivesse um tempo para processar as coisas. Para chegar até lá. Será? Esperava que viesse com eufemismos e rebordosas. Notícia atrelada a um pouco de tempo e conforto para o pensamento. “Precisou ir a uma consulta no hospital”. Algo assim. Egoísta esse pensar…

Minha avó tinha 87 anos. Na hora em que papai me ligou, eu estava na casa da minha vizinha. De 87 anos. Tinha ido ver como ela estava. Dar-lhe um recado. Papai foi direto: “sua avó teve uma parada cardíaca”. 

Foi súbito. Foi do nada. Nos falamos um dia antes.

Nessa hora, senti a navalha. Senti que aquele dia temido chegara. Mas senti também, por estranho e terrível que soe, gratidão. Estive com ela tanto nos últimos dias. Estivemos felizes. Fiz sopa e ela a tomou em minha casa na semana anterior. Comemos juntas chocolate. 

Foi assim. Dessa vez, foi suave sim. Nunca é bom, mas foi como combinava com ela. Éramos amigas. Eu a amava. 

O mundo se reinventa nesse momento. Para mim, se reinventou naquele dia. O mundo da quarentena e o pós(?)-coronavírus será sem ela. Mas em seus últimos dias, nada disso lhe incomodou. Ela apagou como uma rosa que seca. E eu agradeci. Porque sabia que ela iria em breve. E em sua partida, como em vida, ela foi imensamente gentil com a minha dor. 

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