Bem-querer.

Mário Sérgio

“Quando entrar setembro e a boa nova andar nos campos…”, é mais uma loa, expressa pelo genial mineiro Beto Guedes, em 1979, ao início da primavera no hemisfério sul. É possível viajar nessa letra, assim como em todas as vontades expressas no sucesso de 1973, interpretada pela ótima cantora Vanusa que a compôs em parceria com Mário Campanha, “Manhãs de Setembro”.

A chegada da primavera, com suas flores e aromas, estimula o romantismo e parece refrigerar a alma. O que – afirmo convictamente – esperávamos que pudesse se estender ao corpo, pois estamos experimentando um período de muito calor e seca. De certa forma, a expectativa das flores sofrerá algum adiamento. Mas quem somos nós para nos contrapormos à natureza? Faremos um exercício de paciência, mas não de resignação, pois precisamos nos reidratar continuamente.

Toda essa ausência de umidade remete a analisar o ressecamento nas relações e à geração de afastamentos e solidão, muitas vezes patológica e preocupante. Mesmo os órgãos governamentais, ligados à área da saúde, foram estimulados a criar a campanha nacional “Setembro Amarelo”, para conscientizar as pessoas quanto à necessidade de maior conexão para evitar a depressão e o atentar contra a própria existência. Estamos vivendo um mal estranho e de proporção assustadora: na era das comunicações, as relações ficaram mecanizadas. A boa conversa de bar, de esquina ou de cozinha, tem ficado cada vez mais relegada às memórias. Nesse mesmo sentido, são substituídas pelas mensagens prontas, impessoais, pelas emoções eletrônicas de “emojis”, pelo abandono da empatia.

Nesse cenário turvo, a estatística impublicável em detalhes, informa que, em média, mais de 35 pessoas, diariamente, atentam contra a própria vida. Entre as pessoas com deficiência (PcD) o número de casos é quadruplicado. É ainda mais dramático observar que a realidade se mostra bem mais dura, pois as sequelas deixadas por certas patologias ou traumas, em muitos casos, torna impossível qualquer tentativa de autoextermínio.

A velocidade com que a tecnologia transforma o ambiente, as relações e a si própria é tão intensa que nós, os humanos, nos sentimos à deriva num turbilhão de novidades. Queremos e nos empenhamos seriamente em nos adaptar ao novo, porém, quando nos aproximamos do objetivo, percebemos que ele já se distanciou novamente. Mesmo no campo empresarial, os projetos pensados para cinco ou dez anos são atropelados em meses e, às vezes, semanas.

A insana busca por atualizações elimina os fragmentos de tempo necessários para os relacionamentos. A imagem que já foi futurista do personagem HQ, Super-Homem, tornou-se quase uma exigência presente: “mais forte, mais rápido…”. Então, valendo-me de um referencial de desenvolvimento pessoal, se para as pessoas em geral, o “sarrafo está cada vez mais alto”, a indicar que a o nível de exigência para o sucesso é cada vez mais desafiador, imagine-se para uma PcD o impacto resultante.

Que não se faça injusta apologia ao atraso, porque não há razão em em=nfrentar o inelutável, mas que possamos recobrar, pelo bem da própria vida, os momentos de amor, de alegria e de bem-querer.

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