Se tentar subir essa montanha com passinhos delicados, como os de uma bailarina, em breve estará cansada. Daqui a pouco, virá a tempestade e a derrubará. Chegará a noite e não terá onde se abrigar. Rolarão as pedras e você cairá morro abaixo com elas. Para esta expedição, é preciso dar passos firmes e estar disposta. É necessário olhar ao longe e calcular bem o seu percurso. Não adianta caminhar elegantemente se quiser atingir o cume. Há que se sujar inteira de lama, chafurdar na lama se for preciso. Dar passadas de elefante, de dragão e de monstro. Por onde passar, modificar a forração. Arranhar o solo. A elegância na natureza é um mito relegado a alguns mínimos momentos. Elegantemente seria dado o bote de um tigre se aqui houvesse, ou por qualquer predador com fome. A regra desse percurso é sobreviver – na maior parte do tempo, com respeito à vida do outro. Se vierem para devorá-la, no entanto, que se devolva um furo na jugular do atacante até que se esvaia em sangue. Se ousarem agredi-la, que retorne o ataque com dedos nos olhos, golpes alternativos, unhas nas reentrâncias da pele e mordidas. Não tente defender-se com leveza. Será assim, na base da fúria, a única maneira. Se ainda não estiver furiosa, procure saber das coisas que acontecem. Procure entender o que te espera. Não será agindo como uma lebre terna, a presa preferida, que terá mais condições de vitória, mas provavelmente no papel de uma jaguatirica salivante ou mesmo de uma jararaca. É preciso calçar botinas pesadas e entoar gritos altos para afastar inimigos. É preciso, de vez em quando, gritar uns palavrões bem cabeludos, bem feios e de baixo calão simplesmente pelo prazer de fazê-lo, por ódio. Não há caminho idílico nesta empreitada. Não existe beleza bucólica nesta trilha. Ela tem lama, tem nuvens carregadas, tem abismos e precipícios. E nem se escreverão poemas sobre ela embebidos de lirismo, mas sim epopeias. Mortes, renascimentos, feridas, cicatrizes, sofrimentos e por fim, a chegada.
Somente assim você escalará esta montanha.