Dezembriar 

Silvia Ribeiro

Então é dezembro.

Hora de pegar a caderneta e fazer as contas.

Será o que ficamos devendo pro ano que vem? Será que ainda dá tempo de pagar?

Todos os anos somos engolidos por essa euforia de refazer os nossos trajetos, de querer fazer uma faxina externa e interna, e usar um algum truque que facilite esse acerto com a vida, com o tempo, com as pessoas. E principalmente, com os nossos internos.

Legal mesmo seria se houvesse uma varinha dessas bem brilhantes e resetasse tudo num único gesto. E dali em diante, a nossa história começasse com um delicioso cheiro de tinta fresca.

Já imaginou carregar dentro do peito um coração livre, leve, e solto? De visual novo, sem nenhuma poeirinha do passado, nem marcas, e nem essas novelas que protagonizamos no dia a dia.

Seria incrível! Só de pensar já me sinto mais leve e menos melancólica.

E dentro desse balanço inadiável somamos, diminuímos e até dividimos. Um aperto aqui e ali, pra tentar encerrar essa página sem nenhum déficit. E se possível, com alguns créditos pra gastar assim que o próximo ano der às caras.

Depois de inúmeras tentativas percebemos que é um esforço sem razão de ser, um jogo sem ganhadores e sem perdedores. E que o novo calendário não vai pagar as nossas contas (emocionais), tampouco irá se importar com o que vamos construir nos dias que virão. É só uma data.

Ainda que aconteça essa explosão de sentimentos de “primeira vez” gritando forte, e fazendo acrobacias dentro da nossa cabeça, existe uma parte de nós que precisa das boas lembranças, que se orgulha dos tombos, que respeita as cicatrizes, que sorri para aquilo que não foi vivido.

Portanto, é inadmissível jogar o nosso passado na jaula dos leões, ou sair à francesa quando alguma coisa tocar a nossa memória.Talvez ele seja tão necessário quanto o nosso livro de orações.

O bom mesmo é “Dezembriar”, com o coração cheio de esperança, com as mãos envoltas em gratidão, com os sonhos nos tirando da cama, com poesias pra admirar e saudades pra provocar. Deixar que o velho e o novo façam graça por aí.

Que tenhamos uma alma sábia pra viver quantos “dezembros” nos for permitido!

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