Peter Rossi
Nada melhor que uma boa sesta, estirado no sofá da varanda, depois de um lauto almoço. Nosso corpo parece se derramar de tanta preguiça. Fechei os olhos e sonhei. Não me lembro o tema, só que acordei assustado. Deve ter sido algo aterrador pois meu corpo, arrepiado, temia por uma rajada de vento. Continuei deitado do sofá, olhando pro teto, com pensamentos absolutamente desconexos e vazios …
Como se houvesse um cheiro de cansaço. Se o tamanho espaço se perdesse em meio a tantas palavras envolvendo as emoções atribuídas apenas ao passar do tempo, ao corte profundo que o momento cicatriza em nossa pele ressecada pela necessidade de sonhar, sempre sonhar.
E se o dia mais próspero findasse antes mesmo do pôr do sol, umedecendo em demasia as raízes do nosso corpo, retratando um futuro seco e infértil, dourando nossos olhos de suor e sal.
E se a dor se expandisse a favor de um vento seco e frio, que cala todas as vozes e desafina a nota mais profunda de um violão que já fora ávido de alegria e prazer.
E se o gosto do usado demonstrasse a falta de força de vontade, e nossos músculos mergulhassem numa inércia tal que nem mesmos nossos instintivos estímulos se pronunciassem.
E se o cotidiano com toda a sua morbidez, com sua poeira fétida, impedisse-nos de perceber que além do mais alto muro existe a mais bela flor, embebida no orvalho envolvente do desconhecido.
E se toda a história se resumisse no que apenas poderia ter sido …
Se nosso super-herói morresse antes mesmo de ter salvado a primeira e única vítima da inundação do nosso medo.
Se nossas mães perdessem o dom do perdão, ao se comprovar que perdoar passou a ser apenas um ato mecanicamente calculado.
Se nosso corpo abandonasse toda a virilidade de ser corpo, representando apenas o pérfido objeto a mais na relação podre da carne sem o tempero exclusivo e indispensável do amor.
E seu eu não tivesse você. Ah, que saudade de mim!
Tudo isso me provocou arrepios frios. Tomei um impulso e me levantei de supetão. Bati as mãos sobre a roupa, como a extirpar todo o pó alucinógeno que me impulsionou a tal pensar.
Você passou nessa hora e lhe dei um desmedido abraço. Você ficou sem entender tanta impulsividade. Eu respirava fundo, enquanto agradecia aos céus o fato de que pensamentos vãos também se esvaem. Abraçado a você vi que tudo vale a pena. Não queria me desgarrar dali, por nada desse mundo…