Luciana Sampaio Moreira
Eu não me lembrava que dia 7 de abril também é meu. Depois de quase 30 anos de uma carreira, uma data festiva já não me faz sorrir ao lembrar daquele bordão segundo o qual “o jornalismo é uma cachaça”. E é mesmo! Vicia, inebria e, se a gente não se cuida, adoece também.
A relação é apaixonante e cansativa ao extremo. No meu caso, o prazer está na matéria bem apurada e entregue no prazo, no alto da página, na capa da revista e naquela sugestão de pauta que se transforma em uma cobertura sensacional para o cliente e, ao mesmo tempo, ranqueia o nome da gente para o mercado.
Já o processo de criação é absolutamente estressante. Jornalista reporta. Muito do que faço depende do outro. Às vezes me sinto em um garimpo de ouro no estilo “Serra Pelada”, à procura da pepita perfeita que vou transformar em informação para a sociedade. É essa mesma pepita que alimentará minha autoestima e motivação e, ao mesmo tempo, acalmará a chefia (porque líderes nessa área são raríssimos) sempre ansiosa por bons resultados que a gente deve apresentar diariamente ou em extensos relatórios mensais.
O preço que pago é alto! Reconheço. Do planejamento à entrega final do serviço existe muita estratégia, inspiração, saúde e energia empenhadas. Ao assistir ao filme A Grande Entrevista (Netflix), sobre a organização da bombástica entrevista do príncipe Andrey, da família real britânica, que acabou resultando no afastamento do nobre de suas funções em 2019, vi que os perrengues da carreira são os mesmos cá e lá.
Embora desunidos e competitivos de uma forma predatória, somos todos muito parecidos. Alguns mostram a cara, outros são vozes conhecidas. Tem os que atuam na produção, bem longe dos holofotes e há os colegas que se especializam na imagem captada pelas lentes de uma câmera fotográfica e — muito raros — os que se expressam por meio do desenho, como meu ídolo Quinho e o Ziraldo, o primeiro cartunista com o qual tive contato na vida, ainda na infância.
Sigo na lida, gosto do que faço. Passo raiva e xingo — um dos pontos bons de trabalhar em home office — e me reinvento todos os dias. Ser jornalista não é missão, mas profissão e merece mais cuidados e valorização, duas coisas que andam em falta.
Prova disso foi a divulgação, nessa terça-feira, 9, de pesquisa da Fundacentro sobre a saúde mental dos jornalistas brasileiros. Um soco no estômago que só não doeu mais porque sei exatamente o que acontece nesse moedor de carne humana chamado imprensa.
Minha colega e brilhante assessora de imprensa, Cris Reimberg, que me auxilia em pautas sobre SST há anos, integra o projeto que pode mudar a vida de quem está chegando nesse setor, onde tudo é dinheiro e imagem, e o humano é apenas mais uma ferramenta.
Adorei o texto, como você se coloca, suas reflexões. É nítido o seu envolvimento com a profissão, a paixão pelo ofício está ali, mas isso não impede que você se veja e se coloque como trabalhadora, descrevendo como se dá a organização do trabalho na prática, com olhar crítico.