Luciana Sampaio Moreira
A régua da branquitude é de uma exatidão impressionante e vai até a pele branca cuidadosamente tratada e coberta por um pó compacto iluminador importado. Tudo o que passa daí, para racistas, já é preto. E se alguém questiona, a criatura que não nomino por absoluta falta de sororidade, logo se faz de incompreendida e solta o argumento clássico: “Você está me chamando de racista?”
Na verdade, racistas se reconhecem, se admiram, se amam e se defendem. É esse o sistema que legitima as ações de preconceito cotidianas contra os pretos. É isso que torna palatável a segregação racial de brancos no asfalto e pretos lá na favela, a definição de papeis na sociedade e no mercado de trabalho e também a violência policial que atua conforme o público.
Como o Congresso Nacional é o retrato mais fiel da sociedade brasileira, também há racistas por lá. Gente que ganha salário público altíssimo e coleciona regalias para lacrar na internet para os seus iguais, enquanto atua para dizimar de alguma forma os que lhes soam diferentes não apenas pela cor da pele, mas pela opção sexual e pela alegria de exercer o direito à verdadeira liberdade de ser e viver em todos os sentidos.
E quando o professor e ministro de Direitos Humanos Silvio Almeida, convocado mais uma vez por esse mesmo grupo de parlamentares para responder sobre frivolidades, lembra que é preciso defender a parcela de pretos com a mesma veemência que a sujeita defende os interesses dos brancos, a figura, ainda não satisfeita, saca a máxima “sou casada com um negro”.
Essa é uma tática muito comum entre os racistas brasileiros. Covardes, não partem para o confronto. Não se assumem. Acham que terem um preto para chamar de seu pode soar como atenuante após algum comentário “pouco compreendido”. A estratégia, muito manjada, é acender o benefício da dúvida para que, a partir dele, seja possível dar continuidade às investidas criminosas, alegando que é brincadeira.
Ao assistir a cena, corri para as redes sociais para ver o tal negro em questão. E nesse ponto eu sou obrigada a concordar com a tal esposa amantíssima. Porque um negro que se reconhece preto de fato e que honra a sua origem e a sua raça jamais faria parte de um teatro de horrores como esse, apenas para se sentir parte de um grupo.
A régua da branquitude continua poderosa. Entre outras práticas, está a de uma mulher branca reeleita deputada federal correndo atrás de um preto pelas ruas da capital paulista, apontando uma arma para ele, às vésperas do segundo turno das eleições presidenciais de 2022.
E nada aconteceu até o momento! Mas se fosse o contrário…