Citius, altius, fortius - Fonte: Pixabay

Citius, altius, fortius

Citius, altius, fortius - Fonte: Pixabay
Citius, altius, fortius – Fonte: Pixabay
Daniela Piroli Cabral
danielapirolicabral@gmail.com

Dizem que à medida que envelhecemos o tempo costuma passar mais rápido. Devo estar mesmo ficando velha. Tenho me assustado com a velocidade do mundo. A aceleração das relações, dos passos, das emoções, dos pensamentos, das viagens. 

O ritmo do instantâneo, do imediato, o bombardeio de informações, as demandas por produtividade, o excesso de tarefas e de trabalho, tudo isso tem colapsado a nossa vivência da experiência como seres humanos e, consequentemente, nossos modos de existir e de sentir.

A promessa da era tecnológica seria de que teríamos mais tempo livre, de ócio e de prazer, já que estariamos dispensados de realizar uma série de atividades comuns há alguns anos: ficar nas filas dos bancos para pagar contas, ir a um locutório ou orelhão para fazer ou receber esperadas ligações. 

Outro dia, tive que ir à minha agência bancária. Era horário comercial, mas ela parecia abandonada. Apenas um funcionário escondido atrás do computador e um segurança na porta que dava as coordenadas e direcionava o fluxo das parcas pessoas que por ali passavam. As pessoas estão desaparecendo dos espaços públicos, pensei. E o orelhão na minha rua, virou estorvo na estreita calçada, peça sem função, fadada a ir direto para um museu, que desperta a curiosidade de crianças pequenas:

– Mamãe, o que é aquilo?

No entanto, parece ser esse o misterioso paradoxo do nosso tempo presente. Temos recursos na palma da mão. As distâncias se encurtaram. Mas nunca estivemos tão sobrecarregados, atarefados, estressados, alienados de nossa experiência de humanidade. A exigência imperiosa de produtividade e crescimento nos desalojaram da disponibilidade e da abertura para o ritmo próprio da vida. A competição e o individualismo nos alijaram da experiência de percepção e da condição de espontaneidade. 

“Citius, altius, fortius”, mais rápido, mais alto, mais forte, é o que nos demandam. Imperativo de onipotência que nos inebria, nos engana. Não há intervalo ou qualquer possibilidade de interrupção no automatismo frenético do trânsito, das telas, das reações. Simplificação das interações: curtir, comentar, consumir. Isso basta? Conhecimentos e relações superficiais. A lógica quantitativa se sobrepõe à qualitativa nas métricas da vida cotidiana.

Aceleraram a vida para quê? Para chegar mais rápido na morte?

Este texto é um convite à reflexão sobre o nosso tempo, ao exercício do avesso, da contramão, do tédio: lentius, profundius e soavius. Mais lento, mais profundo, mais suave, porque é isso que viabiliza a construção de sentido na experiência humana. 

Como diz Bondia (2002), tudo que faz impossível a experiência, faz também impossível a existência.

 

Fontes:
– Bondia, J.L. Notas sobre a experiência e o saber de experiência.
– Labbucci, A. Caminhar, uma revolução.

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