Engravidei quando meu primeiro filho tinha pouco mais de 1 ano.
Notícia boa, espalhada aos quatro ventos para amigos e familiares. Crescerão juntos, diziam. Serão muito amigos, falavam.
Ganhei flores, presentes e mimos para o pequeno ser que se desenvolvia em mim. Engordei, cresceu o peito.
Guardei as melhores roupinhas do mais velho.
Estimei a data do nascimento. Fui à médica.
Chegando em casa, um dia, um sangramento na roupa. Ali, eu já sabia o que tinha acontecido.
Marquei um ultrassom no hospital em que trabalhava e fui bem cedo, no dia seguinte, sozinha.
Na sala de exame, silêncio. Na tela preta, nada se mexia. De repente, as palavras: o coração do feto não tem mais batimentos. Eu já sabia.
Levantei-me, arrumei-me e fui embora.
A gravidez tinha 9 semanas.
Como médica, sei que abortos espontâneos são comuns. Ocorrem em quase um quinto das gravidezes confirmadas. Sei também que podem ser protetores para evitar o desenvolvimento de fetos “inviáveis”.
Ainda assim, penso naquele bebê inviável. Ele tinha nomes prováveis, já tinha um pouco de história. Sua chegada mudaria tudo o que entendo hoje como vida. Sua partida também. Perder um feto traz uma sensação estranha. Traz uma tristeza. Depois, um alívio por se sentir que a natureza agiu como deveria. Um misto de ambas as coisas que pende um pouco para o desalento.
Depois desse bebê, veio meu filho mais novo, que talvez não existisse se aquele tivesse vingado. É estranhíssimo pensar nisso. Não nos imagino sem o pequeno. De vez em quando, por saber desta história, ele fala da ”irmã” que foi embora para que ele chegasse. Será que “ela” deixou algum vestígio distintivo na cripta que compartilharam?
Ficamos assim, divagando dentro da estatística à qual pertencemos e que em nada representa os delicados detalhes da realidade.
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Que lindeza de texto, traduz o sentimento tal qual ele é... E só sabe quem passou.
Caí aqui por acaso, obrigada pela leitura!