Categories: Sandra Belchiolina

Via Ápia: a via romana, a via da Rocinha, o livro

Quando recebi a proposta de um grupo de Amigos do Livro para lermos Via Ápia, imaginei que o livro estava relacionado a via antiga romana. Para minha surpresa, ele está ambientado na favela Rocinha no Rio de Janeiro, sendo a Via Ápia o lugar de fluxo comercial e moradores da localidade. E as Vias se cruzam em algum momento?

Pesquisando sobre o nome dado na localidade brasileira, encontrei que nos anos 60 o italiano Pompeu Feltrin, morador da comunidade, homenageou a rua do comercio da Rocinha com o mesmo nome da Via Ápia de Roma. Essa que também foi batizada em homenagem ao político e escritor Appius Claudius Caecus. Consta que era uma das principais estradas do Império Romano.

O início da construção da “Rainha das Estradas” – Regina Viarum, carinhosamente chamada pelos romanos, deu-se em 312 a. C, com a dimensão de 300 km, com o trecho de Roma a Cápua (região da Campania). Alguns relatos informam que seu percurso chegava a 500 km. A principio foi concebida para fins militares e comerciais, com o passar dos anos tornou-se testemunho de uma história de mais de 2.000 anos. No século XIX tornou-se um museu ao ar livre. Passear por ela é entrar na dimensão e formas da construção civil da antiguidade. Além da visitar a estrada, pontes, há também sepulturas e necrópoles que nasceram ao seu lado, pois eram proibidos cemitérios dentro das cidades. Também, foi cenário do épico e trágico evento da rebelião de Espartaco e seis mil escravos em 71 a.C. Eles capturados pelo exército romano, mortos e seus corpos crucificados ao longo da estrada.

Atualmente, seu percurso inicia na Porta São Sebastião. Tive a oportunidade de visitar a basílica e as catacumbas homônimas ao santo. É de impressionar a forma e condições sub-humanas que viveram os cristãos durante os anos de perseguição religiosa dada pelo império romano.

A Via Ápia – da Rocinha, é onde transcorre as cenas do livro de Geovani Martins. O autor relata o cotidiano da vida de cinco jovens moradores locais. Desenvolve o enredo, relatando num linguajar corriqueiro, sobre as preocupações dos moradores quando uma UPP (Unidade de Polícia Pacificadora) ocupa o morro.  A ocupação traumática, transtornos e mudanças na vida dos moradores da Rocinha fazem parte do enredo. Uma realidade pouco conhecida dos brasileiros.

O que faz ligação das duas Vias Ápias, a antiga e a da favela? Um aclive com certeza, mas também a vida que passa com suas várias formas de viver, trabalho, perseguições e muitas vezes no limite da agressividade humana.

Sandra Belchiolina

View Comments

Recent Posts

O morro dos pensamentos fluentes (parte 2)

Tadeu Duarte tadeu.ufmg@gmail.com Semana passada interrompi o texto no exato momento crítico em que após…

13 horas ago

Sem imaginação

Peter Rossi Me lembro bem que foi dentro de uma cabana construída com duas cadeiras…

19 horas ago

Cabo Verde e a Ilha do Sal

Wander Aguiar Destino pouco conhecido por nós, brasileiros, Cabo Verde é um conjunto de 10…

1 dia ago

Limites

Taís Civitarese Uma das maiores dificuldades observadas em nosso ambulatório de atendimento psiquiátrico a crianças…

2 dias ago

Fotojornalismo: Filme Guerra Civil

Sandra Belchiolina O terceiro olhar sobre a trilogia que me propus escrever com temática fotógrafos…

3 dias ago

TAEDIUM VITAE

Daniela Piroli Cabraldanielapirolicabral@gmail.com (texto original publicado em 27/05/2020) O cotidiano. Ele já foi inspiração para…

4 dias ago