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De frente com Silvia

Silvia Ribeiro

Tenho tido muitas tentativas de me entender e decifrar algumas ondas que, às vezes, batem forte no meu rosto, e outras que apenas sussurram ao meu ouvido eriçando a minha janela.

E acabei percebendo que dentro de mim abriga um ser que tem vida própria e que vive completamente avesso às percepções que me fazem sentir plena dia após dia. Uma criatura que se mostra acima do bem e do mal e com um humor ácido capaz de comemorar as minhas confusões.

No entanto, tenho uma rebeldia petulante que, muitas vezes, arruína qualquer cordialidade, e por isso resolvi lhe apresentar a famosa DR: “discutir a relação”.

E lá fomos nós.

No fundo eu queria mesmo era apagar o seu estrelismo e mostrar quem realmente manda, ainda que ela se parecesse um tanto madura diante de alguns tópicos que exigem um tratamento pessoal. Mas qualquer coisa já valeria a transição do que eu sou e o que ela queria que eu fosse, e eu não ia me abdicar dessa reforma íntima.

O bate-papo já havia esticado bastante e, num dado momento, comecei a perceber que aqueles seus informais desmandos pareciam interessantes, e que eles tinham uma força que ia além de um joguinho de quem é a dona do pedaço.

Enquanto aquele toma lá da cá ia se construindo, me veio à mente algumas coisas que alinharam a minha coluna, mudando completamente o meu ar de inconformismo em meio aquele comportamento da tal sujeitinha.

Olha aqui, mocinha, apesar dos pesares, devo admitir que você tem lá o seu charme. Meio birrenta, impulsiva às vezes, mas até quando você resolve tirar a fantasia de Cinderela de dentro do peito, não perde a sua forma desembaraçada de ser feliz. Gosto desses seus rabiscos de amor que ficam por aí baseados numa narrativa que é somente sua, e de toda a postura de sentimentos sutis que você provoca nas pessoas.

Quero te dizer que eu também acho incrível o seu jeito criativo de exibir os seus desejos, a sua pele macia adornada por um delicioso óleo corporal, o seu sorriso sexy exibindo um batom vermelho com sabor de pecado, a sua cintura desinibida diante do tempo, o gingado do seu suor cometendo acrobacias loucas, o seu abraço empolgado falando besteiras, e até aquele seu moletom surrado me parece viril.

E depois de todos esses apetitosos elogios, ela tirou uma carta da manga, como é de seu feito, e com uma voz suave me disse: olhe ali bem à sua frente.

Diante do espelho, imagens se misturavam, confundindo os meus olhos e atordoando os meus sentidos. Era como se todos os personagens que eu havia vivido até aquele instante se materializassem diante de mim, ora foscos, ora nítidos.

Veja!

Mesmo parecendo um jeito brusco de se relacionar, somos a capa e a história de um mesmo livro.

De frente com Silvia.

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