Uma imagem bombou na internet. Pelas ruas da cidade histórica de Ouro Preto, uma noiva, parecendo desesperada, subia a ladeira. Logo atrás vinha um conhecidíssimo estilista mineiro, carregando a cauda do vestido.
As legendas foram as mais variadas. Em alguns lugares apenas “estilista ajuda noiva com o vestido que confeccionou”. Em outros: “um engarrafamento nas ruas apertadas de Ouro Preto obrigou a noiva a ir à pé até a igreja, para o próprio casamento, acompanhada do estilista que confeccionou o vestido”.
Diz o ditado que uma imagem vale mais que mil palavras. Será mesmo?
E se eu lhes disser que a história não chega nem perto do que verdadeiramente ocorreu? Minha fonte é uma das pessoas que protagonizou o ocorrido, portanto, das mais fidedignas.
Uma tarde normal, num final de semana, na cidade de Ouro Preto. Mais um casamento a se realizar em uma das suas múltiplas e maravilhosas igrejas. Uma noiva atrasada – o que é até clichê. As ruas de calçamento da cidade histórica, com um trânsito bem apertado. Todos esses ingredientes estavam presentes, isso lá é verdade. Também é comum aos estilistas famosos acompanhar as noivas quando são eles os artífices dos vestidos. Isso também é plenamente plausível.
Mas não foi nada disso!
Vamos aos fatos, que o vídeo não mostrou. Mas, antes, faço a reflexão de que a primeira impressão é realmente a que fica. As imagens impressionam, sobretudo em momentos em que a palavra é absolutamente dispensável para alguns. Basta ver a cena e o óbvio passa a ser a verdade. Nossa preguiça mental, levada pelas facilidades da pirotecnia dos avanços tecnológicos, pressiona nossas retinas criando o funil dos embotados. Vemos o que é mais fácil ver, sem qualquer indagação. E assim, as verdades vão se acumulando, criadas pela nossa expectativa, absolutamente estéreis e fúteis.
Os instantâneos da vida moderna são bem assim: feitos para durar um só instante! E quem piscou, não viu! Quem viu, criou a história, datou e colocou a legenda, dentro de suas próprias conveniências. A imagem é rasa a não permitir uma dúvida sequer. E assim vamos vivendo, um click após o outro. Nossos olhos veem, mas, de fato, não enxergam, não se comunicam. Estamos sendo acostumados a ser tela, ao invés de projetor, o que é lamentável.
O exemplo é a prova viva dessa singeleza, o fulgor é fugaz! Não deixa rastro de história, são só impressões, e ainda sim remotas e traidoras, ladinas, infiéis.
E de pensar, seguimos sem pensar – simples assim! O que imaginamos passa a ser real e sofremos com sensações e consequências inexistentes. Como é possível? Uma droga alucinógena essa imagem instantânea, que tudo pode e a tudo leva. Imagem aberta, história descoberta. Os comentários se multiplicam e o que era sonho se realiza, devidamente plastificado e enquadrado por alguns e adorados por outros tantos.
Viva a vida instantânea em que não é preciso mexer a colher para se dissolver. Essa mistura homogênea permite a heterogenia dos incautos e dos pouco observadores. O sarrafo abaixa a cada dia, em breve rastejaremos por nossas inverdades.
Voltando a história, até porque amargura demais faz mal à saúde, por mais que nos convide a pensar.
Tudo aconteceu de forma completamente diferente do que a imagem materializou. O estilista não conhecia a noiva e, naquele momento, foi apenas um cidadão solidário. Segurou a cauda do vestido porque se assim não fizesse, a noiva entraria absolutamente esfarrapada e suja na cerimônia. De fato, como estilista, sabe o valor da indumentária, mas esse é apenas um detalhe. Ele foi verdadeiramente um homem de bem, ajudando o próximo, ou melhor, a próxima.
O que a imagem não conta é que a moça subia a ladeira usando toda a sua energia, e era motivada pelas palavras do seu ajudante: – corra, corra como se estivesse fugindo de um castelo em chamas! A metáfora é até motivadora, concordemos.
Para embalar seu esforço, me ajuda a lembrar uma querida amiga, o estilista, amigo do pessoal que estava desarmando o show pediu à banda que tocasse a marcha nupcial, em ritmo de jazz. A cena, senão de cinema, preenche o imaginário…
O ajudante, o estilista famoso, não foi o autor do vestido, apenas da boa ação. Nunca tinha visto antes a noiva, embora sensível às cerimônias de casamento. Estava em Ouro Preto por outros motivos, participara de um show que acabara minutos antes e cujos apetrechos entulhavam a rua por onde devia chegar a noiva, de automóvel. Ao ver a coitada exasperada dentro do carro, com a inércia do trânsito, bateu no vidro e aconselhou a menina a fugir dali, a seguir a pé. Mais que isso, aconselhou e aparelhou a fuga. Deu a ideia e forneceu os meios.
Ao que se sabe, o casamento aconteceu. Melhor para a noiva, que além de chegar a tempo, ainda posou no instantâneo como se estivesse trajando um vestido dos mais cobiçados profissionais do ramo, em todo o Brasil.
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