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Uma netinha, da hora!

Rosangela Maluf

Estou esperando que Nadja termine seu tratamento de dentes pra levá-la pra casa. Sou uma boa avó e hoje, atendo a um pedido da minha nora que não poderá vir, serei eu a ir buscá-la. 

Como ótima avó que sou, entregarei a netinha linda, respirarei fundo e voltarei correndo para a minha casa vazia que espera por mim, cheia de silêncios que me nutrem e afagam… 

 A cada dia que passa ando mais impaciente com a meninada que me cerca: netos, netos de amigas, meninada em geral. Não posso reclamar, minha neta é uma menina educada, estudiosa, muito carinhosa e agradável. Vai fazer quinze anos e eu reconheço perfeitamente que seu universo é outro. 

As músicas que ela ouve são terríveis, horrorosas; não têm letra, nem harmonia, nem rimas e cheias de erro de português. Os cantores e cantoras, quase todos de voz muito feia, berram e em dupla, berram ainda mais. Ah, e um refrão insuportável que (você querendo ou não, gruda nos ouvidos), e assim são chamados de “chicletes”.

Cada época é uma época e longe de mim, fazer qualquer comentário, mas quando se diz que o idoso, “tipo assim” tá por fora é porque estamos mesmo. As gírias são próprias de cada época e a gente as aceita, não nos resta mais nada. Mas fico de cabelo em pé com os tipo, tipo assim! Apresentadores de Tv, jornalistas, atores, entrevistados e entrevistadores, todos embalados no tipo, tipo assim cheios de éééééééé´, entre uma frase e outra.

– E por que você fica prestando atenção nestas coisas e não se concentra nas notícias, diz meu filho.  É, pode ser um bom exercício para diminuir minha irritação, impaciência, intolerância, implicância, etc É verdade, deve ser da idade.

Numa noite dessas, ela veio dormir comigo. 

De manhã, meu filho e minha nora passariam pra pegá-la, pois iriam visitar a outra Vó. 

– Ah, Vó, rola de ver Big Brother?

– Sim, filha, pode colocar no canal que você quiser.

– De boa, Vó, dá pra abaixar o som dos “sinfonia” que cê escuta? Vem ver comigo, é da hora, cê vai gostar, vem!

Eu fui, e enquanto assistíamos o programa ela me contava tudo sobre cada um dos participantes. Chamava a todos eles pelos apelidos, como se fosse íntima de cada um. Emitia sua opinião classificando com veemência, os bons jogadores, os bobalhões, as ridículas e por aí íamos, as duas entregues ao BBB. (Meu Deus do céu e da terra!)

Assistimos a umas provas de resistência com os brothers quase morrendo de rodar num carrossel sob vento, chuva, mais vento, mais chuva e o carrossel girando, girando. Aquilo durou horas. Fiquei enjoada só de ver!

E eu lá, assistindo com ela…

Houve briga: uma das participantes surtou, quebrou coisas, gritou e eu fiquei assustada. O nível era de quinta categoria, o palavreado daqueles, ninguém ouvia o outro e a louquinha lá, quebrando tudo. Najda nem piscava, olhando a TV. Já estava no segundo pacote de pipoca. Resolvi pegar um suco pra nós. Fazia calor e ainda teríamos mais BBB pela frente.

– Mano, que irado. Cê viu, Vó, a carinha endoidou de vez. Tá gostando?

– Não muito, filha, mas vejo com você!

– Ah, Vó, é muito maneiro, tá ligada? – Risos – É assim que eles falam Vó, repetem a mesma coisa mil vezes; aí a gente também fala igual

– É! sorri meio amarelo. 

Resultado, o que eu aproveitei daquela noite diferente?

– ouvi 1.236 vezes:  tipo, tipo, tipo, tipo, tipo, tipo, tipo, tipo, tipo, tipo, tipo, tipo;

– 1.100 vezes: tipo assim, tipo assim, tipo assim, tipo assim, tipo assim;

– 1.098 vezes: tá ligado mano, tá ligado mano, tá ligado mano;

– 986 vezes: ó cara, ó cara, ó cara, ó cara, ó cara (pra homens e mulheres)

– 846 vezes: sacou mano, sacou mano, sacou mano, sacou mano; 

– 750 vezes: éééééééééé;

– Ouvi discussões, beijos molhados, pulos na piscina, dancinhas “da hora”, festa animada, muitas comidas & bebidas; gritaria, muita gritaria;

– Quartos tão desarrumados que me perguntei como um ser humano conseguia viver em tamanho lixo.

No embalo da noite, apesar do barulho, consegui cochilar. 

Não sei por quanto tempo; acordei com a Najda me chamando: 

– Vem Vó, vão pra cama, já acabou!

(Rô, vc ainda não tem netos, mas quando tiver, prepare-se: é uma luta! Se der, conte a minha história com Nadja. Vou mostrar pra ela e aposto que vamos rir juntas. Um beijo e obrigada, S.)

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