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Sem imagem, por falta de maquiagem

Peter Rossi

Minha sugestão era uma conversa pela internet, pelo vídeo, afinal de contas estávamos conversando há algum tempo e nunca tínhamos nos visto.

Marquei para a noite daquela segunda-feira. Cheguei em casa, fui direto pra academia e logo após o banho, acabei deitando na cama e adormeci.

Resultado: não conversamos e por culpa minha.

Uma mensagem chegou ao meu celular, na manhã seguinte. Dizia algo mais ou menos assim: vamos conversar, mas sem imagem, porque estou sem maquiagem. Achei aquilo divertidíssimo, ri à beça. Como é a vida, a gente brinca de gato e rato com as percepções. O protótipo nem sempre é arquétipo.

A gente acaba passando um batom na nossa timidez, ou um pó compacto – que coisa mais antiga! – em nossos medos.

Nos vestimos assim ou assado, ou nos despimos sempre tentando extrair do outro a melhor das sensações. Não o fazemos por nós? Acho que sim, mas dissimuladamente. Extrair o prazer alheio é o melhor dos prazeres. É ele que nos satisfaz, embora nem sempre estejamos atentos a isso.

Uma vez me disseram que a vida é um muro. Ela sempre devolve a bola no ritmo em que você arremessou. Uma frase clichê, mas de certa forma verdadeira. Quando isso não acontece, certamente é porque não acertamos o arremesso, seja na velocidade ou na direção.

A beleza que imaginamos é nossa, é ela que nos nutre e arma com a confiança para sermos verdadeiramente despojados. Nesse aspecto a maquiagem, ou as roupas, desempenham um papel fundamental. Além de nos ornar e mostrar o melhor de nós, ainda que disfarçados, compõem o projeto que nos liberta e, bêbados de tranquilidade e esperança, nos desnudamos. A maquiagem nos disfarça de nós mesmos!

Sentir-se bem, com uma roupa bacana, com uma pele lisa, são fatores essenciais pois nos lançam no espaço sideral de nossas maiores limitações. Somos impulsionados a dizer o que pensamos e a externar nossos sentimentos.

O batom emoldura o sorriso que se abre qual janela da nossa alma. O rímel foca a atenção dos olhares que pretendemos alcançar. E eles nos alcançam com a nitidez dos contornos e da profundidade do gesto.

Fico aqui, enquanto estou escrevendo, a pensar na minha interlocutora e sua maquiagem. Seria indispensável? Penso que não, é uma mulher bonita. Mas, lado outro, entendo a sua intenção. A maquiagem lhe daria a segurança que toda mulher tem, mas às vezes mantém escondida.

Falo de maneira genérica, não é um julgamento de uma ou outra pessoa. A frase me fez pensar e pensando concluo que a mulher maquiada se empodera mesmo. 

Se como mulher já abriga todos os nossos sonhos, ainda que em preto e branco, o que dizer então quando transforma o olhar em tela de cinema e a boca em pura sedução.

De agora em diante, quando alguém me disser que não aparecerá no vídeo sem maquiagem, certamente entenderei e, sendo bem sincero, aprovarei a iniciativa, porém torcendo para que ela tenha sempre um batom e um rímel na bolsa, pelo menos.

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