Pobre Marly!
Fazia muito tempo que, em todas as quintas-feiras, íamos as três, no mesmo horário, fazer as unhas no salão da Lena. Era um hábito antigo. Manicures & nós: já éramos mais que amigas, confidentes, conselheiras e humoristas. Entre cafezinhos e gargalhadas, nos divertíamos muito. Era uma forma de nos encontrarmos uma vez por semana, longe do trabalho, dos maridos e dos filhos.
Naquela manhã, Marly chegou um pouco mais tarde. Surgiu séria, rostinho inchado, parecendo ter chorado muito. Ficamos sem saber o que dizer quando ela entrou soluçando para pegar o cafezinho, antes de colocar meus pés de molho e começar a fazer minhas mãos. As outras manicures nada disseram. E nós três também não falamos nada. O clima estava denso, pesado e triste. Não me contive e perguntei o que estava acontecendo. Que ela nos contasse o que se passava; quem sabe poderíamos ajudar.
Marly respirou fundo. Tomou o último gole do seu cafezinho e começou a nos contar a história. Ela falou assim:
– Quando aceitei aquele pedido de amizade, pelo Facebook, a única coisa que olhei, antes de dizer sim, foi o número de amigos que tínhamos em comum: oito, por isto aceitei. Não senti nada de especial e nem fui visitar o perfil dele.
Na manhã seguinte, pelo Messenger uma mensagem linda, uma música romântica e uma figurinha muito interessante, que eu ainda não conhecia: um coelhinho que mandava um coração e depois se escondia timidamente. Achei engraçado. Sorri e enviei um bom dia, bem menos entusiasmado…
Durante uma semana, todos os dias eu recebia, pelo Messenger, o mesmo tipo de mensagem, música, e as figurinhas bem humoradas. Respondia com a minha habitual falta de entusiasmo até que na segunda semana, já enviando figurinhas com coração, resolvi passar meu whats – afinal eu nunca usava o Messenger. Começamos a nos falar todo o dia, por recadinhos no whats e toda noite, ao vivo, no celular.
Só sei dizer que rapidamente passou o primeiro mês. Passamos a enviar mensagens ao longo do dia. E rapidamente passaram-se também o segundo, o terceiro e o quarto mês.
Foi ele quem sugeriu vir do interior para BH pra me conhecer. A gente se entendia bem. Dávamos boas risadas ao nos falar, nas lives pelo celular. Não era um homem bonito, mas era bom de papo, e eu gostava imensamente quando ele ligava: noite sim, outra não. Era romântico, mandava músicas que falavam de amor. Era calmo no falar. Tranquilo. E mandava muitas fotos. Dele, da mãe velhinha, das duas filhas. E eu também mandava fotos.
Tinha 46 anos, como eu. Duas filhas, como eu. Separado há muito mais tempo e, segundo ele, nunca mais nenhum relacionamento sério. Não queria nunca mais viver junto… como eu!
Só sei que os dias foram passando até que ele marcou uma data. Ele viria de carro numa 6ª feira, ficaria na casa da madrinha que morava na Gameleira e aqui combinaríamos o que fazer juntos.
Durante uma semana só falamos disto, da vinda dele. Fizemos planos, ensaiamos umas safadezas, muitos risos e eu esperando pela confirmação da sua chegada.
– No sábado atrasado, depois que saí do Salão, tive tempo de dar uma passadinha no Shopping. Vi numa vitrine uma promoção de roupas de cama e não resisti: comprei jogo novo de lençol, com flores, muito lindo. Estava na promoção, pude dividir no cartão. Não ficou caro. Fiquei imaginando nós dois… vocês sabem como é, né?
(Enxuga uma lágrima no lenço de papel. Pede pra Lurdinha trazer outro café pra ela e pra nós também… e continua a história). Nenhuma de nós perguntava nada, só ouvíamos atentas já imaginando qual seria o final…
– Onde que eu parei? Ah, sim, comprando os lençóis. Pois é, aí achei que deveria estrear uma lingerie bacana. Fui nas Lojas Americanas e descobri um joguinho de calcinha e soutien, com preço ótimo. Nem precisei dividir. Um jogo azul, com renda, e com a calcinha maiorzinha, pra não ficar mostrando muito as gordurinhas, já sabem, né?
– Na semana passada, ele viria. Viria na sexta-feira. Chegaria em BH na hora do almoço. Sabia que eu estaria trabalhando e me ligaria pra dizer que chegou. Paguei pra minha ex-cunhada arrumar meu apartamento. Ela caprichou. Limpou tudo. Trocou toalhas, limpou os vasos de flor. Passou cera em tudo. Ficou brilhando. Eu sentia até frio na barriga. Pensei tanto em encontrar aquele homem. Queria tanto conhecê-lo. E ele também queria estar comigo. Ele disse isto mais de cem vezes. Disse até que estava apaixonado, acreditam? Repetiu isto muitas vezes, e eu ficava contente, na minha, mas sem falar de paixão. Queria vê-lo primeiro.
Olhem que absurdo: conversamos na quarta-feira e ele me disse que estava tudo certo. Chegando aqui me ligaria, mas ainda nos falaríamos na quinta-feira. Na quinta-feira mandou música do Wando. Figurinhas de coração. Desejou bom dia, mas ao longo do dia, só umas poucas figurinhas. Não era comum que ele se portasse assim. Perguntei o que havia acontecido. – Muitos problemas pra resolver – ele respondeu.
Na sexta-feira, nenhuma mensagem. Nenhuma música, nenhuma figurinha. Nada. O salão estava fervendo de movimento e só fui almoçar lá pelas três da tarde. Olhava o whats a cada minuto, nada. Foi me dando uma agonia. O frio na barriga só piorando. Mandei recados dizendo da minha preocupação. Estava ainda em viagem? Tudo bem na estrada? Nenhuma resposta. Nem figurinhas, nada.
Meninas, vocês acreditam que nada recebi durante a tarde, nem durante a noite. Mandei dezenas de perguntas. O que houve? Onde você está? Fala comigo…
Vocês não vão acreditar, Sábado, domingo, segunda, terça, quarta… nem uma palavra, nem uma ligação, nem um recado. E o pior, deletou o perfil dele no Facebook. Não existe mais no Instagram. Não tenho como acessar o Whats.
Entrei em desespero. Estou até tomando Rivotril que a minha comadre me deu. E nem assim tenho conseguido dormir. Quando relaxo um pouco, durmo mal, acordo mal. Fico mal o dia todo. Trabalho mal. Coloquei minhas meninas pra dormir comigo, quero alguém perto de mim, mas não tá adiantando nada. Tô muito mal, muito mal mesmo. Quero saber o que aconteceu, só isto. E não tenho como saber.
Ela solta a minha mão. Volta a enxugar as lágrimas e se levanta. Olha o celular. Nos mostra a tela: nada! O que a gente pode fazer em situações assim? Falar o quê? Ela volta, retoma minha mão, termina de lixar, passa a base. As mãos tremem um pouco. Abre o vidro do esmalte que irei passar. Enxuga novamente uma lágrima que ainda insiste em cair.
Me sinto uma bobalhona. Quero ajudar e não sei como. Olho para as duas amigas, ambas com cara de tacho. O que falar numa hora destas? Como ajudar uma pessoa tão decepcionada, desencantada, ferida em sua autoestima, sem saber como lidar com tamanha rejeição? Como tentar explicar o silêncio do “apaixonado”? Como imaginar o que pode ter realmente acontecido?
Olho novamente pras amigas, pedindo socorro, mas elas também não sabem o que dizer. As amigas da Marly nada dizem. Nenhum comentário. Seguem fazendo as unhas das outras. Uma delas também chora baixinho. Lamento tanto. Lamento profundamente. O fato em si e minha total falta de recursos para ajudá-la.
Ah, esses “amores” de internet!
Pobre Marly!
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