“Cuidado com los miedos, les encanta robar sueños.”
Tenho planos de ser feliz no ano que vem. Apesar da carestia, do noticiário duro e sanguinolento, das doenças e até desse sentimento coletivo de Apocalipse. Tenho sonhos gigantescos, que encheriam centenas de vidas com experiências incríveis. Na noite passada, sonhei que tinha feridas na boca e nos dedos e que poderia estar com a varíola dos macacos. No sonho, a cidade era distante, o único posto de saúde estava fechado e eu não consegui descobrir se tinha ou não tinha a doença. Apenas me afastei das pessoas e busquei uma maneira de encontrar atendimento. Mas acordei antes.
Eu não tinha medo. Tinha cautela para não contaminar os outros, mas não tinha medo. Uma fé inabalável me dava a certeza de que, com ou sem doença, o futuro estaria ali. E eu estaria nele. Uma amiga, talvez impaciente com os meus arroubos sonhadores, sentenciou que ela é uma pessoa realista e eu, uma esperançosa. Eu gostava muito de Ariano Suassuna, que se dizia um “realista esperançoso”. Ainda gosto, na verdade. Porque Ariano não vai morrer nunca.
Mas não sou como Ariano e talvez me enquadre mais entre os otimistas, que ele considerava tolos. Tive um namorado que gostava de me chamar pela alcunha de Pollyanna porque, segundo ele, eu estava sempre fazendo o jogo do contente, apesar da minha constante e paradoxal melancolia. Na última década, venho me dedicando a estar cada vez mais presente, para não me afogar no passado nem me sufocar com a ansiedade do futuro. Mas não quero jamais me livrar da esperança e do sonho com os dias vindouros.
Chegamos? Não chegamos?
Haja ou não haja frutos,
pelo sonho é que vamos
(Sebastião da Gama)
Minha filha de 14 anos tem planos de se apaixonar e sonhos recorrentes com uma fuga para Marte, diante do fim do mundo. Não herdou a tolice da mãe, pelo visto. É uma realista esperançosa, como Ariano, o que muito me orgulha. Ela vislumbra o fim do mundo, mas não se rende a ele. Sigamos, pois, para Marte, Júpiter, Saturno, Urano, Netuno e até o finado Plutão. “Minha velha traga meu jantar: sopa, uva, nozes e pão.” A mnemônica para lembrar os planetas me traz a alegria infantil que também segue conosco.
Tenho planos de ser feliz no ano que vem. E de me alegrar neste outubro. Qualquer alegria. E também planejo seguir sonhando sonhos pequenos, grandes e enormes.
Pelo sonho é que vamos.
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Que delícia é ler seu texto, Dani!
E sim, pelo sonho é que vamos…
Mas confesso que pertenço a ala das realistas com pitada de tolice… kkkkkkkkkk
Bjs