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Qual o seu nome?

Peter Rossi

Não que eu seja um saudosista (na verdade sou, inveterado), mas a proximidade do local de trabalho com um dos mais tradicionais restaurantes de Belo Horizonte acabou por me influenciar na escolha. Já conhecia o lugar, vez ou outra lá ia. Mas agora, basta atravessar a rua, com o computador debaixo do braço e devorar os melhores momentos do dia. Uma cerveja gelada (não todo dia) e um arroz sujo, que nada mais é que o filé e o arroz envolvido no caldo. Delicioso!

Observo que são três os garçons fixos. No final da semana, na sexta-feira, esse número aumenta sensivelmente. Me agrada observar que todos são mais velhos que eu. Não que o sejam pura e simplesmente, o que mais me deleita é que estão na ativa. Por trás das máscaras, certamente sorririam.

Olhos postos na rotina do lugar, observei que um deles, Isaías, sempre corria a me atender. Um sujeito baixo, com cabelos brancos alinhados, magro, com 65 anos, aproximadamente.

– O de sempre, doutor?

– Espere um pouco, meu amigo. Hoje é sexta-feira, posso me dar ao luxo de tomar uma cerveja antes de comer alguma coisa.

– A de sempre, não é?

– A de sempre!

Computador aberto, apressadamente começo a ler os textos, afinal tenho nada mais nada menos que quatro livros para revisar. E os autores, todos eles, sempre querem o serviço prá ontem, não importa quantos erros cometam.

Essa é uma rotina de mais de dois meses. Chego, abro o computador. Sento sempre na última mesa. Não quero incomodar, tampouco ser incomodado. Logo chega aquele garçom franzino, sorriso escondido atrás da máscara.

– Uma cerveja?

– Hoje não, amigo, tenho ainda coisas a fazer.

E assim se desenvolvia a vida, às vezes acordada pelas buzinas incansáveis na Avenida Olegário Maciel. Como as pessoas são aflitas, querendo chegar nos locais aonde não chegarão, sempre atrasadas ao que se propõem.

 A tela do computador é meu porto seguro. Enxergo todas as letras, ordenadas uma após a outra, sobre o fundo franco. Levanto os olhos e vejo os casais nas outras mesas. Em algumas, vários empregados da mesma empresa, comemorando o aniversário de um deles. Os garçons, ao redor, fazendo coro, mesmo sem ter a mínima ideia do nome do aniversariante.

Quando o coro é para as crianças, confesso que interrompo meus afazeres e também bato palmas. Toda e qualquer criança é digna de aplausos, agora e sempre.

Mas escrevo agora, porque o inusitado me alcançou nesse sexta-feira. Após o filé com arroz, e uma cerveja – hoje é sexta-feira – pedi ao garçom a notinha. Já eram duas e meia, me atrasara. Um senhor mais obeso, com cabelos negros veio me perguntar se queria alguma coisa. Disse que não, bastava a conta.

E não é que meu amigo veio com a cartela e duas máquinas de cartão em suas mãos?

– Olá doutor, me desculpa hoje não consegui atendê-lo. Tinha uma mesa com mais de vinte pessoas e o patrão pediu que eu desse uma atenção especial.

– Sem problemas – respondi meio desatento. Queria voltar logo para o escritório.

Entreguei o cartão, já sabedor das mazelas: a gorjeta numa máquina, o valor da conta em outra.

Meu amigo passou o cartão, eu digitei a senha. Pegou a outra máquina e a operação se repetiu. Perguntou se eu queria a minha via do comprovante. Disse que não. Ele retirou o pedaço de papel e seguiu para o caixa. Voltou, entretanto, à minha mesa e perguntou:

– Qual o seu nome? No comprovante não sai nada.

– Me chamo Peter, e você?

– Meu nome é Isaías. Me desculpa perguntar, mas eu estava ficando aflito. Tinha até comentado com minha mulher. Vejo o senhor quase todos os dias e não sabia como fazer. Queria te chamar pelo seu nome.

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