Água, o símbolo da vida. Nenhum de nós vive sem ela. Desce por nossas gargantas e nos convida a viver sublimes emoções.
Minha amiga Júnia, proprietária de uma loja de artigos de decoração, costumava servir um bom café com biscoitos e trufas às suas clientes e respectivas decoradoras, enquanto discutiam os preços do orçamento. Ao lado da pequena xícara, um copo alto, com água até a metade.
Quem abastecia a loja com o precioso líquido era um rapaz alto, bem branco e magro, vergando óculos de grau enormes, com lentes “de fundo de garrafa”, sempre suado, vestido com um macacão azul. Era empregado de uma empresa terceirizada, especializada no assunto.
Duas vezes a cada semana, o entregador de água fazia o seu serviço, com total descrição, carregando aquelas bombonas pesadas e adaptando-as nos servidores de água próprios que a fazia brotar geladíssima.
Era um jovem rapaz, ciente de suas obrigações. Entrava calado e calado saía. Não se notava a sua presença. Os passos eram lentos e silenciosos, certamente sob o peso dos galões.
Essas são tarefas às quais damos mínima importância, até que nos faltem. Não nos preocupamos com a intrincada engenharia que leva a energia elétrica às nossas casas, mas basta que fiquemos sem luz e passamos a sentir a indispensabilidade de tais serviços.
Com a água é igual. Ela jorra das torneiras dos filtros e nunca pensamos todo o largo caminho que percorre até chegar às nossas bocas. Não conhecemos nossos entregadores de água, com eles jamais trocamos uma palavra sequer.
Assim acontecia com a Júnia e o rapaz dentro do macacão azul, até que um dia, fugindo completamente da sua rotina, pediu que lhe servissem um pouco da porção mágica que entregava – um simples copo de água.
O dia estava realmente quente, e infindáveis gotas de suor desciam de tobogã pelo pescoço do jovem, a encharcar a gola do macacão.
Foi Júnia quem se apressou a servir água para o rapaz. Passou-lhe o copo, cheio até a boca, que o jovem tratou de sorver.
Após o largo gole, e passando as costas da mão esquerda sobre seus lábios, como se guardanapo fossem, colocou o copo vazio na pia da cozinha da loja e, respirando fundo, falou:
– Muito obrigado à senhora. Que mal lhe pergunte, mas qual é o seu nome?
– Me chamo Júnia, o meu nome é Júnia.
– Júnia, e lá isso é nome? Isso é apelido!
– Não, é meu nome mesmo!
– Não acredito! Ninguém tem esse nome – Júnia. É muito esquisito. Nunca conheci ninguém que chamasse assim. A senhora tá brincando né?
– Meu amigo, não estou brincando. Júnia é o meu nome, aliás um nome comum, conheço várias outras Júnias.
– Olha dona, a senhora vai me desculpar, mas estou aqui apertando as mãos pra não rir. Júnia é um nome muito engraçado, não sei não ….
À essa altura, Júnia já se divertia com aquela conversa, embora não conseguisse entender a surpresa do seu interlocutor. Apesar de aparentar ser um rapaz bem simples, era um jovem e os jovens são sempre antenados. Enfim.
Virava o corpo, após se despedir do entregador de água, quando cismou de perguntar o seu nome.
– E você, meu amigo, como se chama?
– Ah D. Júnia – ele pronunciou o nome pausadamente – eu me chamo Cleydiônitrom, mas a senhora pode me chamar de Jonathan!
Júnia preferiu não encarar o amigo e a passos apressados, seguiu para o centro da loja, afinal uma nova cliente chegava, não sem antes pensar com seus botões:
– A vida tem cada uma …. Cleydiônitrom!
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