Tais Civitarese
Minhas unhas nunca estiveram tão grandes. Elas sempre se quebravam ao chegarem a um certo tamanho. Por isso, sempre as usava curtas, mesmo pintadas, sem nenhuma porção acima da polpa dos dedos.
Desta vez, estão longas, duras, feito garras. Creio que são as vitaminas que venho tomando. Gosto de tê-las assim. Aos 40 anos, ter unhas grandes é mais um passo inédito que venho experimentando.
Agora, sinto-me armada. Estou de posse de um instrumento cortante de defesa. Que ninguém venha me importunar. Para qualquer coisa, tenho as unhas.
Antigamente, eu achava que quem tinha as unhas grandes não fazia trabalhos domésticos. Preconceito ou coincidência. As minhas se partiam ao menor toque numa bucha com detergente. Esta semana, fiz várias tarefas em casa e elas continuaram intactas. Talvez até mais brilhosas.
Nunca imaginei o poder simbólico que poderia advir de meros fâneros. Talvez nem seja isso. Talvez seja o meu corpo todo que esteja ficando mais forte. As unhas apenas mostram que estou bem no cálcio, no silício. Estar nutrida permitiu o desenvolvimento delas e também de outros instrumentos. As unhas refletem a agressividade que busquei por muito tempo, mas faltava no sangue. O meu estava ralo, sem ferro, sem nem mesmo capsaicina.
“Par delicatesse, j’ai perdu ma vie”, dizia o poeta.
Eu não quero perder a vida. Quero unhas que finquem a parede se for preciso, para não me deixarem cair. Que furem espaços, que coloram minha aparência. Que possam arranhar quem me machuca se eu precisar me defender. Que cocem docemente as costas dos meus filhos. Que estalem em um ruído crocante quando eu encostar nas coisas.
Quero unhas que rasguem as bolhas onde vivo, que me ajudem a escavar outros terrenos, a riscar horizontes. Que arranhem e que deixem marcas mortíferas naquilo que quero fazer desaparecer. Um tecido morto que teceu para mim possibilidades de vida. Que cresça, que se parta, que arranhe, que transpasse.